É fato que Ferreira
Gullar é um excelente poeta, e também que o tento
escrever aqui, não conseguirá chegar nem próximo à densidade e
complexidade que constituem esse grande artista.
Assistindo ao
programa Roda Viva, da TV cultura, fiquei bastante impressionado com
a qualidade de seus versos, que ainda se mantém no novo livro "Em Alguma Parte Alguma", e, sobretudo, com sua visão de mundo antidogmática, mas ao mesmo
tempo confusa.
Ferreira tem posições
muito firmes e que esbarram no conservadorismo referente a drogas,
sistema político, etc. Mas talvez o que mais incomode seja sua
crítica constante ao que chama de “mentira”, “ilusão” sem
que aponte nenhuma, não chamarei de solução, mas uma síntese
eficaz para suas contradições. Isso fica bem claro quando afirma
que o socialismo acabou, ou em outro momento afirma máximas do
altruísmo, como o homem e a vida só ter sentido no momento em que
enxergamos o outro, e acaba por repudiar o capitalismo, e apontando uma possível saída que é esse sistema ser "vigiado". Ou
seja, apesar de crente numa relação mais humana, e à frente daquilo
que temos no capitalismo, ele não admite e nem propõe o fim do
sistema, que o próprio poeta chama de perverso – como verão no
vídeo abaixo, ele tem suas justificativas para tal.
O ponto de vista
político-partidário de Ferreira Gular não, necessariamente, me
incomoda tanto, já que sua obra é algo muito além de sua confusão
política. E convenhamos: É compreensível a crítica, principalmente aos partidos. Sabemos como funciona a maior parte dos
partidos políticos e sua relação com a subjetividade, sobretudo na
arte, são brutalizados quase tanto quanto o senso comum criado no
capitalismo. E, talvez, por isso seja ainda mais atraente a pergunta: Como, o poeta, sabendo mais do que ninguém, que numa sociedade, onde
relações humanas são mediadas pela mercadoria, logo, homens
brutalizados e quase nulos em totalidade daquilo que é produzido
enquanto arte em seu espaço, pode acreditar que num “capitalismo
vigiado”, pode haver aquilo que descreve como vida? Já que na mais
simples relação de 'benevolência', o que está em jogo não é o ser
humano próximo de mim, mas o quanto custa tudo aquilo que nos
permeia: tempo, quantidade, possibilidades, etc.
Sem dúvidas, há uma
contradição enorme e uma hipocrisia sem igual na esquerda, que, por
vezes, é preferível escutar a um conservador convicto de sua
mesquinhice. E, talvez, esse seja um dos pontos críticos cruciais da
fala do poeta. Ainda assim, o que é mais “doloroso” é que
nossos “exemplos” tenham deixado de sonhar, e talvez, por isso,
seja nosso dever, dos jovens, fazê-lo – vale a pena lembrar: a
definição de jovem, aqui, não tem a ver com a rugas,
ou nosso questionável conceito de tempo, mas, sim, nossa capacidade de sonhar.
Danilo,
ResponderExcluirSuas observações sobre a entrevista de F.G. além de pertinentes, nos animam.
De fato, nele, o pensamento só não desagrega por completo, porque ainda constrói sua frágil unidade sobre a criação poética. Outra aspecto que ainda também o mantém "inteiro", está precisamente em apoiar parcialmente sua crítica ao sistema, naquilo a que renuncia. Ou seja, nega o capitalismo, para afirmá-lo mais à frente.
muito viva sua análise!
Parabéns!
maria
Muito obrigado Maria!
ResponderExcluirAcho que é isso mesmo, nós vivemos não mais no "século das incertezas" mas agora no "século das incoerências".
Bom, vamos sonhando!
Abs
Danilo