O Coletivo Cinefusão surge, no final de 2008, a partir da iniciativa de trabalhadores de diversas áreas - cinema, jornalismo, publicidade, artes cênicas, filosofia, arquitetura, fotografia -, empenhados em criar primeiramente uma rede colaborativa que pudesse dar conta da junção dessas linguagens e também da possibilidade de abarcar potencialidades em busca de produção artística independente, mas também de reflexões concretas acerca da sociedade. É principalmente sobre este último pilar de atuação política, que o grupo vem, atualmente, pensando o cinema, sempre vinculado a outras expressões artísticas e movimentos sociais.

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Um Lugar ao Sol ou Como Não Tremer de Frio


(texto publicado originalmente no site http://brcine.com.br/)

Certa vez, ao ser questionado acerca do porquê de as imagens tremerem, o cineasta cubano Tomás Gutierrez Alea disse que elas tremem porque há mãos que as seguram. Nada mais materialista do que a resposta que leva em consideração as pessoas que trabalham para que um filme seja realizado. E a partir disso, uma imagem pode tremer, porque o ser humano é instável ou porque assim o quer aqueles que estão por trás das câmeras. Sem um contato concreto com o pernambucano Gabriel Mascaro, não há como objetivar suas intenções com o documentário Um Lugar ao Sol, mas sem dúvida é possível investigar o porquê de suas imagens tremerem.

O longa tem início justamente com a explicação de um método – 125 moradores de valorizadas coberturas, foram contatados, a partir de um livro que cataloga pessoas influentes, e apenas nove aceitaram dar entrevista –, o que imediatamente já coloca que estamos diante de um “filme-tese”, preocupado sim em determinar algumas questões. Em seguida, antes mesmo de termos contato com qualquer cobertura, a imagem é a de uma planta em um canteiro de obras, prestes a perder o seu pedaço de terra e também o seu lugar ao sol, por conta das obras. É a metáfora que Gabriel encontra para colocar, a sua maneira, que o trabalhador está diretamente em conflito com aqueles que têm garantido justamente o lugar ao sol que lhes é negado. É por isso que em seguida, a câmera sobe junto com um elevador de obras, acompanhando o movimento do trabalhador, que sobe aos céus para outros morarem.

O filme fala sobre a tendência de verticalização das grandes cidades, no caso Recife, São Paulo e Rio de Janeiro, mas persiste também na evidência quase surreal do contraste, do trabalho humano. É por isso que, enquanto um dos entrevistados fala sobre a indescritível sensação de abrir a sua janela e ter o mar a sua frente, Mascaro não nos mostra o mar, mas o sujeito que, pendurado à janela, limpa os vidros da cobertura. São escolhas de um cineasta que resolve sim se posicionar e interferir esteticamente na realidade objetiva que tem a sua frente. As filmagens de elevadores subindo são constantes e dramatizadas propositalmente para apresentar personagens que se sentem protagonistas de sua própria condição social. Estes mesmos entrevistados agem, o tempo todo, de maneira teatral exagerada, com trejeitos e falas que beiram a mais criativa das ficções.

No entanto, por mais fascinantes que esses personagens possam ser, Gabriel Mascaro não permite qualquer tipo de identificação e revela o seu próprio desconforto de estar ali, escutando de forma passiva determinados argumentos. É por isso que, em quase todas as entrevistas, a fotografia de Pedro Sotero busca criar distanciamento, principalmente através de movimentos de zoom repentinos durante alguns planos, que parecem dizer ao espectador que o incômodo da equipe também existe e que o olhar não pode deixar se contaminar. Assim, a presença da câmera se revela, como mediadora de uma relação que no momento é estética, mas que precisa ser política também para ser plena. E é por isso que as poucas intervenções de Gabriel são calculadas e, mais uma vez, surgem ora para criar distanciamento e revelar o aparato fílmico ora para colocar um posicionamento.

Uma artista plástica explica a sensação de domínio que ela tem por morar nas alturas, mas diz que não pode ser totalmente feliz sem dar a mão ao próximo e, por isso, trabalha como voluntária em um hospital de câncer. Segundo ela, o egoísmo é o mal do mundo. Então, surge pela primeira vez a voz do cineasta, que a interrompe para questionar se o voluntarismo vai acabar com isso, para em seguida revelar a visão maniqueísta da mulher. Em outro momento, o filho, que acompanha a mãe sendo entrevistada, corta a conversa e diz: “mamãe, acho que você está cometendo um erro gravíssimo. A senhora devia responder olhando para a lente e não para eles”. Novamente, Gabriel intervém para colocar que não tem problema com isso. São passagens que, qualquer montador preocupado apenas com a fábula e os formatos convencionais excluiria sem pensar duas vezes, mas aqui vão ressignificando o próprio processo pelo qual essa equipe passou.



Um Lugar ao Sol se enquadra numa categoria de documentários que se veem obrigados a “trair” seus personagens. Porém, estamos efetivamente diante de uma traição que não se pessoaliza e recai sobre os indivíduos. É uma traição de classe, necessária e que se revela, por exemplo, quando uma personagem afirma achar interessante que ele (diretor) faça um documentário de algo positivo, porque as pessoas só fazem documentários de coisas negativas, sobre a miséria. A personagem engrandece a iniciativa e aí a traição se revela inevitável, pois o impasse é político, de visão de mundo, mesmo que diretamente ligado a um processo de alienação, que está o tempo todo evidente no filme. Ironicamente, uma das entrevistadas tem o hobby de registrar seu cotidiano com uma câmera amadora e, enquanto filma o Cristo Redentor, explica que gosta de “sentir através de uma lente”. Nessas passagens, Gabriel Mascaro se apropria das gravações que ela faz e as utiliza no filme, mostrando, por exemplo, a imagem do filho que dorme. “Este é o mundinho dele, um pouquinho mais amplo, porque ele tem essa vista toda”, afirma ela.

É justamente ao humanizar os seus personagens e revelar a profunda contradição em que estão inseridos, que o documentário faz pulsar uma melancolia que beira o insuportável. A pergunta que logo nos vêm à cabeça é existencial, na medida em que questiona a doentia sociedade em que estamos inseridos. No entanto, o cineasta não isenta esta aristocracia pós-contemporânea de culpa, não cai na vala comum da compaixão, pois insiste, o tempo todo, em revelar a contradição discursiva, em negar a salvação através do valor cristão. A mesma mãe que é carinhosa com o filhinho critica e condena o desmatamento, que os moradores da favela fazem no morro e o “bang bang” que é obrigada a assistir. Outra chega ao ponto de narrar, de maneira fascinada, que o morro de Santa Marta é todo colorido, cheio de balas tracejantes. “Eu tenho o privilégio de ver fogos quase que diariamente. Isso é meio trágico, mas lindo”, diz a personagem que, em seguida, explica que tem uma área de serviço, onde mantém seus empregados distantes para preservar sua privacidade.

É a partir da relação com o espaço, que o documentário traça um preciso perfil da classe dominante brasileira, vítima sim de um processo de alienação cruel promovido pelo capitalismo, mas ainda assim responsável pelas ideologias que propaga e pelo conservadorismo disseminado. Falamos aqui de apenas nove pessoas, mas que servem de amostragem do aparato ideológico que comanda as relações sociais brasileiras. Por mais que haja exceções, reconhecemos discursos comuns como o de que “não é porque o cara é pobre que ele tem que ser bandido”. Se, por um lado, o empresário, dono de boates em São Paulo, pensa que todo pobre deveria ter no mínimo um prato de comida na mesa, por outro, é reticente com a ideia de que é assim mesmo, “no avião, você tem a primeira classe, a executiva e você tem a senzala lá no fundo. Eu vim ao mundo para os prazeres da vida”. Durante esta mesma entrevista, Gabriel Mascaro pergunta: “o que é poder pra você?”. A resposta, “poder é um prazer muito bom”, vem junto com um zoom repentino na cara do entrevistado, uma maneira de se distanciar de algo tão absurdo.

Em texto publicado na Revista Cinética, Fábio Andrade critica a estreiteza da estratégia do filme, que se foca principalmente na opção de se morar no alto de um prédio. Porém, não é justamente essa delimitação consciente de um método que se permite chegar a traços tão definidores de um grupo de pessoas determinados enquanto seres sociais? A condução das entrevistas é tão acertada que, para além da tese, conhecemos sim esses personagens e características de suas individualidades, incluindo hobbies, religião, relações familiares, questões filosóficas etc. Pelo contrário, o olhar não parece pré-definido, pela simples constatação de que aquela equipe está construindo sua tese enquanto filma, incomodada sim com o que vê e ouve. A personagem que se constrói da totalidade dos depoimentos é a desigualdade, que está latente à revelia dos discursos contrários destas pessoas.

É necessário despersonalizar os discursos justamente para não se atacar as pessoas, mas o próprio discurso. Não é somente para Gabriel Mascaro que morar em coberturas é uma questão de classes, mas para todo aquele que olha de forma mais atenta para o que está determinado. O discurso de classes não é exterior a obra de arte, pois não é leviandade dizer que a luta de classes existe enquanto verdade dentro e fora da arte, como elemento fundador da realidade. Portanto, toda obra que se proponha a afunilar a relação entre classes é no mínimo coerente com qualquer pretensão emancipadora do ser humano. Se há algo a ser combatido, estrategicamente nada mais sensato de que revelar as divergências e isolá-las ao invés de conciliar. É sintomático que quase todos os depoimentos de Um Lugar ao Sol, busquem a explicação transcendental, metafísica para as condições sociais, deixando de lado, justamente a questão de classe.

Em determinado momento, vêm à tona a simbologia máxima do filme que remonta às civilizações em que os astros e, principalmente o sol, eram venerados como deuses. Mãe e filho falam sobre a proximidade de um fenômeno único, em que Marte se aproxima de tal forma da terra que é possível ver o planeta do tamanho da lua. Então, o filho, personagem que parece retirado da mais bem construída ficção, diz que eles precisam ver marte, nem que aluguem um avião para furar as nuvens e adentrar aquele cenário onde Deus descansa. Enquanto acaricia um gato em seu colo, a mãe reflete que esta é uma vantagem de estar na cobertura. Mascaro questiona se é estar mais perto de Deus e ela responde que sim, que eles podem falar com Deus mais facilmente. A conversa segue por mais alguns instantes, até que desconfortável ela pede que a filmagem pare um pouco. Então, a traição se consuma novamente, não por falta de ética como podem muitos colocar, mas por excesso. Ética de quem se posiciona frente a tempos sombrios. A fábula do espaço é a metáfora essencial daqueles que lutam para que um dia todos tenham o seu lugar ao sol. A câmera de Pedro Sotero, Gabriel Mascaro e toda a equipe de Um Lugar ao Sol treme sim. Treme de medo, treme de insegurança, treme de raiva, treme de perplexidade e treme de frio, pois se o sol não surge, a frieza determina tudo a todo instante.

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

CINECLUBE CINEMA EM REVISTA #2


O Coletivo Cinefusão, em parceria com a Cia Antropofágica, convida para a segunda sessão do "Cineclube Cinema em Revista", que dá sequência ao Ciclo "Cinema-Greve". Exibiremos, "A Guerra dos Gibis" (de Thiago Brandimarte Mendonça e Rafael Terpins), "Libertários" (de Lauro Escorel Filho) e British Sounds (de Jean-Luc Godard) O convidado para o debate será o parceiro Thiago Brandimarte Mendonça, do Coletivo Zagaia. A sessão é gratuita e ocorre a partir das 18h01, no Espaço Pyndorama (Rua Turiassú, 481), sempre no último domingo do mês.

A representação do trabalhador no cinema remonta à primeira exibição pública, ocorrida em 1895, na qual foi exibido “A Saída da Fábrica Lumière em Lyon”. De lá para cá, os filmes não só se converteram em entretenimento, como também abriram possibilidade para uma perspectiva crítica. Com isso, o ciclo “Cinema-Greve” que propomos pretende resgatar, em primeiro lugar, o espaço de debate característico das experiências cineclubistas, além do prazer estético e experiência coletiva de assistir a um filme. Num primeiro momento, tratar do tema greve pode parecer simplista ou até mesmo uma obviedade. No entanto, é imprescindível entender inclusive como o capitalismo assimilou e incluiu em seu vocabulário cotidiano o termo greve. Greve de fome, greve de sexo, na tentativa de desarticular um instrumento da classe trabalhadora para combater aqueles que detêm os meios de produção. 



Cineclube, experiência de recuperação do espectador morto. Espaço onde o óbito não é aceito sem diagnóstico. O especialista, neste caso, está desconvidado, o diagnóstico é feito de forma coletiva, sobre a égide do universalismo, em contraponto com a educação tecnocrata das instituições de ensino. O nosso ciclo é direto, Cinema-Greve. O cineclube é permanente, Cineclube Cinema Em Revista. Um participa da ação do outro. E afirmamos: A arte tem que ter uma perspectiva revolucionária, caso contrário, os ursinhos carinhosos dominarão. Será sempre convidado alguém que valha realmente a pena, inclusive, os sujeitos da mídia-piada brasileira. Neste caso, não garantimos que não ocorra um ataque feroz por parte dos presentes, sempre no nível do debate, mas prometemos lançá-lo para o abismo de suas contradições.

A parceria é com Cia Antropofágica, estômago antropofágico do teatro brasileiro. Nas suas encenações, o verbo explodir é uma ação de vitalidade estética, carregam T.N.T de baixo dos braços. Escarram na cartilha dos bons costumes cênicos. Seus animais, são os de bucho ruminante. Não poderíamos estar melhor acompanhados. 

No cardápio pipoca. Comida de índio. Supervalorizada pelo cinema de shopping. Para finalizar, o famoso passar chapéu, este dos mais variados, todos contendo o suor dos que ali exercem seu oficio.  

Estão quase todos convidados: 

“E sobretudo, meu corpo, da mesma forma que a minha alma, evitem ficar de braços cruzados em atitude estéril de espectador, porque a vida não é um espetáculo, porque um mar de dores não é um proscênio, porque um homem que grita não é um urso dançando...”

(Aimé Cesaire)

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

EXISTE UM BLOCO BRANCO?


Do ponto de vista dos trabalhadores, o que vimos ontem em São Paulo? As principais organizações de esquerda desfilaram (ou melhor: tentaram desfilar) pelas ruas da cidade. Qual o verdadeiro conteúdo do desfile? Do início ao fim, a tentativa de "conduzir" o ato assumiu um caráter inteiramente burguês. Era inevitável, já que os "inimigos" - aqueles que representavam o ponto de vista dos trabalhadores no ato - eram os meninos do Blac Block.

Antes da polícia mostrar os dentes, a repressão já havia começado. Mas, como? Por parte de quem? Da própria esquerda. A repressão da polícia, nesse sentido, foi apenas um "complemento natural". De certo modo, inclusive, as constantes tentativas, por parte das organizações, de isolar o bloco negro, foram mais odiosas que a própria repressão policial - afinal de contas, a polícia é um inimigo nítido.

Não é delírio. Literalmente: a esquerda preparou o terreno para o "massacre". E a repressão veio a galope, como sempre, sem distinguir o preto do rosa: a própria esquerda foi "massacrada" pela polícia. Mas tudo bem, desde que, amanhã cedo, todos saibam que "a culpa foi do Black Bloc". Parece delírio, mas é verdade: a repressão não começou com as bombas da polícia, mas lá atrás, no início do ato.

No lugar da polícia, estudantes universitários, organizações de esquerda (PSTU, PSOL, e derivados). É como diz o provérbio: com tais amigos, quem precisa de inimigos?

E a razão é simples: a maioria dos integrantes do Black Bloc são pobres. Não é exagero. Trabalhadores ou filhos de trabalhadores, que, na ausência de perspectivas mínimas, atiram-se na via da ação direta. Os militantes das atuais organizações de esquerda talvez não sejam capazes de compreender essa motivação. Afinal de contas, dentro do capitalismo, a possibilidade de estudar, comer bem, viajar, etc. não deixa de ser uma perspectiva máxima.

Isso explica a disposição e a coragem dos meninos do bloco negro, e também a arrogância da esquerda. O antagonismo de classe apareceu como fator central, ganhando expressão empírica em vários momentos do ato. Divergências táticas, oposição ao anarquismo, defesa dos professores, etc. é tudo mentira. Insistir em supostas divergências táticas - como faz o PSTU e o PSOL, por exemplo - é mentir para os trabalhadores. Uma crítica "tática" ao Black Bloc é objetivamente impossível. Demonstra, além do mais, uma profunda incompreensão da luta de classes.

Não bastam as mentiras da mídia burguesa, da igreja, da família? Certamente, não. É preciso ainda (e sobretudo) a mentira política, historicamente preparada pelos "representantes" da classe trabalhadora. O Black Bloc, atualmente, é o setor mais avançado da juventude brasileira. É uma dura verdade, difícil de reconhecer. A ação do bloco negro é uma projeção insuportável da ausência total de perspectivas na qual afunda a juventude. No fim das contas, expor a falta de perspectiva, por meio da ação direta, converte-se num modo inteligente de recuperar alguma perspectiva.

Eis a questão. Esta é a "dialética intrínseca" que determina a ação do Black Bloc: expor a falta de perspectiva para recuperar alguma perspectiva. Não faz sentido? Mas, na realidade, as questões que a esquerda se coloca são outras: o que é o Black Bloc? Jovens absolutamente desconhecidos, agindo "por fora" das organizações. Há um profundo sentimento de propriedade nesse incômodo. Tudo o que diz respeito aos trabalhadores (métodos de luta, palavras de ordem, etc.) é como se fosse propriedade privada das atuais organizações.

Mas, novamente, a AÇÃO do Black Bloc inverte a pergunta: na verdade, senhores, quem lhes deu o direito de controlar os processos de luta, com unha de ferro, no lugar dos trabalhadores? Mito de narciso às avessas, o método da ação direta acaba sendo uma espécie de espelho da crise de direção: utilizado pelo bloco negro, expõe à luz do dia os métodos da própria esquerda, e seu verdadeiro conteúdo de classe. E a esquerda, totalmente incapaz de auto-crítica, responde, por sua vez, exigindo que o Black Bloc "preste contas" de seus métodos.

Nas ruas trava-se uma verdadeira relação de força. Ou os meninos do Black Bloc aceitam o enquadramento na legalidade burguesa, ou a esquerda realiza uma auto-crítica, e tenta absorver a energia revolucionária do Black Bloc. Evidentemente, as direções não largam o osso. Só um imbecil acreditaria nisso. O Black Bloc, por sua vez, se mantém fiel a seus métodos (até quando?). No limite, a consequência é óbvia - e foi o que vimos ontem em São Paulo: na medida em que não conseguem reprimir a ação do bloco negro, a maioria dos setores da esquerda tende a defender, abertamente - em bloco branco! -, a legalidade burguesa.

O bloco negro não espera muito de si mesmo. Não encara a ação direta como meio de superar o capitalismo. Está claro. É inaceitável que uma organização que se propõe dirigir os trabalhadores contra o capital seja capaz de negar esta evidência. A ação direta é apenas uma tentativa imediata de recuperar o futuro. Se amanhã os trabalhadores tomarem as ruas, não fará o menor sentido a destruição de agências bancárias, ou concessionárias.

Nas Teses de Abril, Lênin propôs: "Fusão imediata de todos os bancos do país num banco nacional único sob controle dos Sovietes de deputados operários".

O conteúdo desta tese não está contido, de algum modo, na ação do Black Bloc? Porém, quanto aos meios para atingir esse objetivo, não faz o menor sentido exigir respostas do Black Bloc. Tal exigência é apenas um meio sórdido utilizado pelas organizações, para desviar o foco de suas próprias responsabilidades.

Se o espírito de junho não morreu, isso é devido à ação direta do Black Bloc. Os mesmos que, no Rio, usaram o próprio corpo para proteger os professores, contra a repressão. Os mesmos que, ontem, saíram às ruas com o objetivo de proteger o ato, e, mesmo assim, foram rechaçados pela esquerda, pelos próprios manifestantes.

No entanto, ao contrário do que muitos pensam, o repúdio da esquerda em relação ao Black Bloc não é pontual. É apenas a manifestação superficial de profundas mudanças nas condições da dominação burguesa no país, que, por diversos motivos, é cada vez mais instável.

A velha "espontaneidade das massas" pode e deve atingir níveis mais altos de radicalização. Consequentemente, os verdadeiros contornos dos atuais partidos da esquerda - todos, sem exceção, considerando o que representam atualmente -, tornar-se-ão cada vez mais nítidos, do ponto de vista de classe, isto é, aos olhos da classe trabalhadora.

Com certeza, a repressão da polícia não foi nada, em relação ao que pode. Mas, do outro lado não é diferente: o Black Bloc ainda é pouco!

Não se trata de acreditar no elemento espontâneo como meio de superação do capitalismo. Trata-se da certeza de que a radicalização espontânea é uma consequência inevitável das próprias contradições desse sistema. E que, portanto, tais contradições evidenciam a falta de horizonte das direções atuais. Isso ficou provado, mais uma vez, ontem.

Todo apoio ao Black Bloc!

Saudações vermelhas ao Bloco Negro!

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Cineclube Cinema em Revista (Vinheta)



Cineclube, experiência de recuperação do espectador morto. Espaço onde o óbito não é aceito sem diagnóstico. O especialista, neste caso, está desconvidado, o diagnóstico é feito de forma coletiva, sobre a égide do universalismo, em contraponto com a educação tecnocrata das instituições de ensino. O nosso ciclo é direto, Cinema-Greve. O cineclube é permanente, Cineclube Cinema Em Revista. Um participa da ação do outro. E afirmamos: A arte tem que ter uma perspectiva revolucionária, caso contrário, os ursinhos carinhosos dominarão. Será sempre convidado alguém que valha realmente a pena, inclusive, os sujeitos da mídia-piada brasileira. Neste caso, não garantimos que não ocorra um ataque feroz por parte dos presentes, sempre no nível do debate, mas prometemos lançá-lo para o abismo de suas contradições.

A parceria é com Cia Antropofágica, estômago antropofágico do teatro brasileiro. Nas suas encenações, o verbo explodir é uma ação de vitalidade estética, carregam T.N.T de baixo dos braços. Escarram na cartilha dos bons costumes cênicos. Seus animais, são os de bucho ruminante. Não poderíamos estar melhor acompanhados. 

No cardápio pipoca. Comida de índio. Supervalorizada pelo cinema de shopping. Para finalizar, o famoso passar chapéu, este dos mais variados, todos contendo o suor dos que ali exercem seu oficio.  

Estão quase todos convidados: 


“E sobretudo, meu corpo, da mesma forma que a minha alma, evitem ficar de braços cruzados em atitude estéril de espectador, porque a vida não é um espetáculo, porque um mar de dores não é um proscênio, porque um homem que grita não é um urso dançando...”

(Aimé Cesaire)