O Coletivo Cinefusão surge, no final de 2008, a partir da iniciativa de trabalhadores de diversas áreas - cinema, jornalismo, publicidade, artes cênicas, filosofia, arquitetura, fotografia -, empenhados em criar primeiramente uma rede colaborativa que pudesse dar conta da junção dessas linguagens e também da possibilidade de abarcar potencialidades em busca de produção artística independente, mas também de reflexões concretas acerca da sociedade. É principalmente sobre este último pilar de atuação política, que o grupo vem, atualmente, pensando o cinema, sempre vinculado a outras expressões artísticas e movimentos sociais.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

LABORATÓRIO CINEFUSÃO - EXPERIMENTO #3

EXPERIMENTO #3 - O TRABALHO NOS FARÁ DIGNOS

A proposta do experimento surge da conhecida análise do sociólogo alemão Max Weber, presente no livro “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”, em que o Calvinismo surge como doutrina responsável por trazer à tona o espírito capitalista. O exercício vem, então, como proposta de negar a visão religiosa da predestinação, que entende o homem como escravo de seu destino e o trabalho como único reflexo da salvação. Essa ideia também está presente no pensamento liberal, que reafirma o caminho da plenitude através do trabalho, e que mercantiliza o próprio tempo, com a máxima “time is money”.

O intuito é evidenciar a contradição presente na sociedade de classes no que diz respeito à relação do homem com o trabalho. A proposição weberiana encontra eco na própria Declaração Universal dos Direitos Humanos, datada de 1948, que coloca logo em seu artigo primeiro a questão da dignidade humana:

“Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.”

Trechos como este surgem inverossímeis e até irônicos em relação ao capitalismo, já que a destruição das potencialidades humanas é o próprio princípio fundados do capitalismo ao coisificar as relações e mercantilizar toda atividade do homem. No que diz respeito ao trabalho, a tal Declaração, diz:

Artigo XXIII

1. Toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. 
2. Toda pessoa, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho.      
3. Toda pessoa que trabalhe tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social.    
4. Toda pessoa tem direito a organizar sindicatos e neles ingressar para proteção de seus interesses.
Citamos um trecho também da pesquisadora Lívia Mendes Moreira Miraglia para determiner a própria incompatibilidade entre a coisificação do homem e sua dignidade garantida:

"Inicialmente, cumpre salientar que a dignidade impede que o homem seja utilizado como mero
instrumento, como meio para a consecução de um fim. O ser humano é fim em si mesmo e não se admite em nenhuma hipótese a sua “coisificação”.  Nesse sentido o magistério de Kant, para quem os seres racionais estão submetidos a um imperativo categórico que determina que “cada um deles jamais trate a si mesmo ou aos outros simplesmente como meios, mas sempre simultaneamente como fins em si”


Assim, a proposta gira em torno da ideia falha, e repetida comumente, de que o trabalho dignifica o homem. Como afirma Marx “o dinheiro é a essência alienada do trabalho e da existência do homem; a essência domina-o e ele adora-a”. Portanto, o trabalho, ao expropriar o homem dos meios de produção, cria na realidade a alienação e impossibilita a verdadeira natureza do trabalho, que seria a de transformar livremente a natureza, de acordo com suas potencialidades e vontades.

Enfim, concretamente, a realização dos vídeos deve partir da proposta de criação de um roteiro a partir do cenário de um ambiente ou relação de trabalho, no qual um personagem é retratado diante de uma situação de plena contradição na relação com seu patrão ou colega de trabalho que represente uma hierarquia superior. O tema essencial da “dignidade” é colocado em questão e a cena denuncia a impossibilidade de o trabalho dignificar o homem na sociedade capitalista.

Regras estabelecidas:

- máximo 7 minutos de duração sem contar créditos iniciais e finais;
- cada um dos cinco envolvidos terá uma limitação criativa que será sorteada antecipadamente: obrigatório que seja um vídeo em plano sequência (Dida Beller); proibido o uso de trilha sonora (Domenico Salopini); obrigatória a utilização de voz off (Oswaldo Janete); proibido a utilização de atores profissionais (Volim Habar); utilizar apenas um cenário (Ermelino Escobar); trazer alguma questão de gênero (Raoni Yacamin).
- Eventualmente são permitidas as trocas de limitações entre os envolvidos caso haja comum acordo;






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