O Coletivo Cinefusão surge, no final de 2008, a partir da iniciativa de trabalhadores de diversas áreas - cinema, jornalismo, publicidade, artes cênicas, filosofia, arquitetura, fotografia -, empenhados em criar primeiramente uma rede colaborativa que pudesse dar conta da junção dessas linguagens e também da possibilidade de abarcar potencialidades em busca de produção artística independente, mas também de reflexões concretas acerca da sociedade. É principalmente sobre este último pilar de atuação política, que o grupo vem, atualmente, pensando o cinema, sempre vinculado a outras expressões artísticas e movimentos sociais.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Luiz Carlos de Oliveira

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No último sábado (15/12), pela manhã, o estudante - e jovem - Luiz Carlos de Oliveira, 20 anos, suicidou-se por enforcamento no centro acadêmico da Unifesp Guarulhos. 

Cursava o primeiro ano de filosofia. 

Na noite anterior (sexta-feira), ocorreu uma festa no mesmo centro acadêmico - festa, segundo dizem, para reinaugurar o "espaço dos estudantes". 

Frente a isto, deveríamos nos perguntar qual o verdadeiro significado da "festa" atualmente, quer dizer: haveria algum conteúdo emancipatório efetivo na "festa", como outrora nos carnavais? O que acontece nas festas? 

Seguindo: qual o verdadeiro significado de "universidade"? 

Ou o significado da juventude, e da própria vida, enfim, num mundo onde jovens de vinte anos se enforcam, ou invadem escolas infantis matando dezenas de crianças. O que tais "fatos isolados" querem dizer a nós? 

Por exemplo, já disseram, em algum lugar, que apenas vinte e quatro horas na vida de um homem é o bastante para ele aprender o que fazer ao longo de toda sua vida. Presume-se, com isso, que não precisamos de muito para saber de tudo.

Muitos pensam que não devemos envolver questões políticas em respeito à memória de Luiz Carlos. Ou seja: mencionar o fato de que ele era negro e pobre, numa universidade dominada por uma classe-média branca e estúpida; ou dizer que certamente ele sofreu racismo dentro da universidade, é uma forma de "desrespeito".

Penso exatamente o contrário. De tudo na vida não só podemos, mas devemos (deve-se aos mortos), tirar conclusões políticas - o que dizer, então, de um suicídio? 

Luiz Carlo ingressou em 2012 na UNIFESP. Ou seja: topou com uma greve que paralisou a universidade ao longo de todo o primeiro semestre. Mas ele participou ativamente, foi preso, realizou balanços pessoais, entregou seu corpo, enfim, recostando-o do lado certo da barricada. 

Noutras palavras, como dizem, o ingresso na universidade é uma "nova fase" na vida de uma pessoa. Foi recebido pelos grevistas, e pela greve. Tomou contato com organizações de esquerda que atuam dentro do movimento estudantil. Enxergou, momentaneamente, quem sabe, alguma perspectiva. 

E, no entanto, suicidou-se. O que aconteceu?

A esquerda, talvez, não dá mais pé a quem precisa. 

Quanto à memória, vale dizer: aqueles - não todos - que tiveram contato com ele não se recordam de tê-lo ignorado ou o tratado com indiferença em algum momento?

Para não falarmos da indiferença institucional, ou das inúmeras vezes em que professores olham com desconfiança um negro, pobre, que ousa estudar e falar, e se mover no espaço, e desejar a vida como qualquer ser humano.

Quem matou Luiz Carlos foi o racismo da sociedade brasileira, o racismo fora e dentro das instituições de ensino. Quem matou Luiz Carlos foi a impossibilidade material, subjetiva e última, da sobrevivência.

Pelo que dizem, Luiz Carlos se enforcou a uma distância que lhe permitia botar os pés no chão. Todo enforcado mexe as pernas, freneticamente, à procura do chão. No caso de Luiz, por que seu corpo, naturalmente - pensamos nós - não pisou o chão, para impedir o prosseguimento da dor insuportável e do sufocamento? 

É que a esquerda, repito, não dá pé a quem precisa. A culpa do capitalismo não é o suficiente para explicar a incapacidade de destruí-lo, por parte daqueles que dizem lutar por sua destruição. A culpa do capitalismo é relativa, sim, quando nós, os incapazes de destruí-lo, sabemos que não é impossível destruí-lo, e, mesmo assim, essa consciência não conduz no caminho da sua destruição.

Luiz Carlos dobrou as pernas, "conscientemente", fazendo questão de não esticá-las, para além das súplicas do corpo.

Me pergunto: que dor é essa, afinal, mais forte que a dor do corpo, a ponto de mantê-lo, obstinadamente, preso pelo pescoço até o último instante de vida, abrindo mão de manter-se de pé?


Abaixo, link's de dois vídeos de Luiz Carlos, cantando:

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=cf0yyJctp0c

http://www.youtube.com/watch?v=wuSmiKfICrM

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segunda-feira, 26 de novembro de 2012

E se vivêssemos todos juntos?

O filme francês "E se vivêssemos todos juntos" debate, e em alguma medida problematiza, a chegada dos seres humanos à velhice. 

A construção da frase acima aponta para duas vertentes opostas: primeiro, uma possível redução a uma réles obra, e segundo, quando se leva em conta o mundo que vivemos, nos guia em direção de como e para onde a obra pretende construir seus discurso.

A primeira coisa, que acredito ser importante apontar, é que o filme se constrói a partir do ponto de vista de uma classe média-alta francesa, que chegou aos  80 anos de idade, com todos os conflitos existenciais, físico-biológicos, que qualquer ser humano irá passar, e a eminência de, simplesmente, deixar de existir - sensação que quanto mais o tempo passa, mais latente se apresenta. Entretanto, imagino, que para aqueles que recebem a obra sob um ponto de vista "de abaixo" (falo do terceiro mundo, que diferente da França, não possui os cuidados da vida pública, que só são possíveis historicamente através das relações de trabalho, tanto dentro do país, quanto da relação do país com o continente, e sucessivamente, para mais e para menos, com o mundo), o filme é potente, mas no que diz respeito ao caminho com que se chega a velhice, se torna uma sensação bastante agradável - sensação que se expõe não só por como os personagens levam a vida: jantares regados das melhores refeições, casas confortáveis, a opção por manter um jardim ou construir uma piscina para os netos, até a forma bastante conservadora da fotografia, mas que não atrapalha em quase nada a clareza e beleza com que a história é contada.

Escrevo sobre este filme tentando tornar um pouco mais complexa, e sincera, a relação de espectador, e lutando insistentemente para que não critique o filme, a partir de uma possível ideia do que seria um filme meu. Logo, o paralelo do terceiro mundo, afim de expor um antagonismo de classes sociais, existe como forma de manterem vivos aqueles que recebem a obra e procuram criar algum tipo de relação com ela.

Meu ponto de vista, e que representa o de uma classe social, dentro do sistema capitalista, recebe o filme, a partir de uma realidade social bastante inversa: todos os cuidados básicos que vemos no filme com os seres humanos caem por água na realidade brasileira, sendo modesto, e um tanto reducionista, na análise. Na realidade tupiniquim nossos velhos morrem nas filas das aposentadorias, depois de terem trabalhado (terem tido sua força de trabalho explorada) sobre toda sua juventude, onde os cuidados básicos de saúde em todas as idades são cada vez mais precários, em paralelo à indústria farmacêutica, por sua vez, atrelada a uma ciência que permanece sob o mesmo regime de pesquisa aos interesses única e simplesmente de mercado. Se é possível a comparação há no mínimo uma discrepância bastante considerável no que diz respeito a dignidade dos caminhos para se chegar na velhice.

Lembro de uma fala de Paulo Arantes sobre o filme "Entre os Muros da Escola", também francês: "Genial, mas essa sala de aula do filme, para nós - no Brasil- é o céu". P. Arantes se referia obviamente a condição dos educadores da rede pública de ensino no Brasil.

Esse tipo de análise é cada vez mais recorrente quando se coloca filmes produzidos em nações de grandes potências econômicas, com outras realidades, "emergentes", atrasadas, que sofrem ainda os processos tardios do capitalismo.

Geralmente estes filmes, quando se propõem a criticar o mundo em que são engendrados, que apesar da metafisica do absurdo que faz crer que, muitas vezes, o inferno dos outros são só os outros, dão conta de outras problemáticas, que a história trata de escancarar cedo ou tarde: depressão, alto indíce de suicídio, frieza das relações humanas, e que num futuro próximo sempre terão como grande final uma crise econômica - vejamos o que tem acontecido com as economias das grandes potências.

Longe  de supor alguma inutilidade do filme em relação a realidade, cada vez mais devastadora, em todos os âmbitos da vida, ele apresenta um ponto de vista de extrema sensibilidade não só em relação ao pavio curto do vida, mas também, que nesta trajetória, somos meras coisas, que quando a pele já não a mesma da mocinha da capa da revista, nossos dentes não são tão fortes, não somos mais, sequer, humanos.

Seria uma admirável estupidez dizer, como dizem alguns críticos ao capitalismo - de artistas a intelectuais - que filmes como esse reduzem a questão mais abrangente - política - a um drama muito especifico do mundo. Este, também(!), ainda é um grande problema.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

São Paulo precisa morrer



“A este ponto chegamos e na comissão de frente intelectuais mortos de medo de abrir a caixa de Pandora das transformações não triviais”.  

(Paulo Eduardo Arantes – Duas vezes pânico na cidade)


O que acontece com São Paulo? Num artigo de 2006, Paulo Arantes, falando dos “ataques do PCC” ocorridos em maio daquele ano, diz: “São Paulo é uma cidade morta”. A resposta é suficiente, quando se trata da grande mídia, para quem a violência dos últimos dias é uma exceção à regra: São Paulo, no caso, é uma espécie de matrona romântica e civilizada, merecedora de respeito. Caecus 1, que não merecem, nem pedem argumentos.

Já para os teimosos de plantão, que ainda investigam - em tempos de social-democracia irrestrita e imoderada - as ultrapassadas (e assim mesmo atuais) razões históricas, o resto do artigo tem bastante interesse. A começar pelo título: “Duas vezes pânico na cidade”. Serve hoje, pois: as chacinas dos últimos dias são como um segundo capítulo dos ataques de 2006.

E os outros paralelos? Um deles, bastante óbvio: os encapuzados, dizem, que chegam matando seriam membros de “grupos de extermínio”, já existentes no “período militar” (designação completamente imprecisa) com características análogas.

Mas os grupos de extermínio, comboios da morte, etc. são um lado do problema. A esse respeito, a confusão entre as versões disponíveis é cômica, e trágica: ora os exterminadores, ora o Partido (como o chamam os correligionários do PCC), mas, de todas as versões disponíveis, nenhuma, agonicamente, é capaz de abarcar a totalidade do fenômeno. Trabalho de forças ocultas, visivelmente fora de controle.

E os representantes do poder oficial? Absurdamente ingênuos, ou altamente comprometidos? Pois, do contrário, como explicar que os mesmos, em suas declarações, parecem saber menos do que a própria população?

Algo de instrutivo se revela nesse “ocultismo da ordem”: para os “artistas que protestam”, coloca-se a pergunta: Como “representar” (ou apresentar), esteticamente, o descontrole necessário do capital enquanto força histórica? Força material que rege a vida à luz do dia (e da noite), ao mesmo tempo visível em suas causas, mas intocável em seus mecanismos de reprodução.

A violência em curso não teria algo a dizer nesse sentido, isto é, expressão máxima e real, quer dizer, não “representada”, deste processo de autonomização dos interesses do dinheiro? Não é novidade o fato de que a força destrutiva inevitável do capital precisa justamente da destruição consumada para se tornar convincente.

O título do artigo, “Duas vezes pânico na cidade”, também força por atualizar, em condições nossas, a vermelha fórmula, sábia, porém gasta pelo uso, que diz: “primeiro como tragédia, depois como farsa”. O conteúdo de verdade, aqui, potencializa-se a ponto de não caber mais no próprio molde, baralhando tudo, quando a farsa já é trágica em si mesma, coincidindo, ambas, na permanente violência da acumulação originária, repetida, parece, toda vez que o arranjo provisório do poder (legal e ilegal) se desestabiliza.

Outro paralelo, no artigo, nos fala de uma “desconexão social das elites”, a respeito de uma classe-média alta que teria abandonado para o futuro a construção do próprio futuro. Fenômeno de desconexão social, que, em todo caso, é mundial, e o exemplo citado é Londres, onde a guerra contra o terror islâmico paralisou a cidade. Para não falarmos de Nova York, ou o problema da imigração na França.

E os paralelos se sucedem, traçando coordenadas: em contraposição, por exemplo, ao desligamento social das “elites” (no jogo ideológico, o uso insistente de um termo pode revelar sua inadequação, ou falta de exatidão, cobrando, por isso, a utilização de aspas. É o que ocorre frequentemente com a expressão “elite” e tantas outras. Trata-se apenas de um “escrúpulo” conceitual, talvez, mas que o discurso petista, por exemplo, ignora, quando se refere insistentemente à ”classe-média”, contradizendo-se na medida em que esvazia o conceito por “excesso de uso”. Pergunto-me se o simples uso das aspas, tão inofensivo em sua dualidade conceitual, não poderia complicar a manutenção do poder nas mãos do PT), como dizíamos, o contraponto do desligamento é o desalento e o abandono político dos trabalhadores nas periferias. Pior: segundo Paulo Arantes, até mesmo o desalento dos trabalhadores, quer dizer, o medo, não lhes pertence mais, roubado que fora.

Espécie de dupla impotência: paradoxalmente, há uma incapacidade de exprimir sequer um medo autêntico, numa situação, entretanto, em que se justificaria a autenticidade do medo. E isto por que:

“a população atônita e em pânico: ou melhor, dizendo que está em pânico, quando perguntada, porque é isto que ouve, vê e lê [na mídia] a respeito de seu suposto estado de espírito”

No ponto em que se fala dos trabalhadores, fecham-se as coordenadas. A situação dos pretos, pobres e delinquentes, jovens evangélicos ou não, mortos antes mesmo de tomarem consciência do que significa estar vivo. Aqui, aliás, no horizonte de auto-representação da classe, é que se encontra a chave da “caixa de Pandora das transformações não triviais”.

Vejamos: de todos os paralelos traçados no artigo, há um forte, que faz analogias insuspeitadas entre os fatos do presente e uma data distante: a greve geral ocorrida em São Paulo em 1917. Segundo Paulo Arantes, na visão daquele motim da nova classe operária, liderada por anarquistas, “afloram profeticamente pavores urbanos vindouros”.

À primeira vista, são escaladas de forças contrárias: repressivas e fascistas atualmente, e libertárias, legítimas em 17. Ocorre que, para as elites do período, habituadas no trato com escravos, o modelo da greve geral, tipicamente europeu, soava monstruoso demais, assustador, suscitando manifestações de repulsa patriarcal. O povão nas ruas, organizado exclusivamente para acabar com a “paz pública”.

Noutras palavras, o modo pelo qual as elites interpretaram o motim guarda afinidades surpreendentes com a visão que a mídia e as “elites” atuais fazem do PCC. O velho jargão: independentemente da condição real, jamais se justifica a desordem, o que, em outras palavras, significa uma incompreensão pura das raízes sociais do crime organizado.

Qual o significado de uma reação similar da elite nos dois momentos, ou melhor: qual o significado de uma mesma reação em relação a “inimigos” tão diferentes?   

Nota:

1 – Os antigos romanos utilizavam o termo para designar o que é cego, invisível, duvidoso, etc. Utiliza-se aqui respeitando, obviamente, toda a dubiedade da palavra.


João .

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quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Casa da mãe, ou A poesia de cada dia: um exercício descritivo para fins unicamente artisticos

Casa da mãe. Na cozinha: uma tábua de passar, algumas roupas em cima; no alto uma casinha de madeira, nela estão pendurados: duas colheres de pau africanas que dei de presente à minha mãe, quando mais novo, uma sacola de plástico e um pequeno avental bordado a mão. Ainda mais a esquerda um filtro de água daqueles que se pode escolher entre água natural e gelada. O filtro está logo acima de uma fruteira. Ao lado do filtro, um calendário, com a foto de um bebe sobre uma margarida e um texto:

CONVERSANDO COM DEUS

Pedi força e vigor; Deus me mandouDificuldades para me fazer forte.

Pedi sabedoria; Deus me deu problemas para resolver.

Pedi prosperidade; Deus me deu energia e cérebro para trabalhar.

Pedi coragem; Deus me mandou situações perigosas para superar.

Pedi amor e Deus me mandou pessoas com problemas para eu ajudar.

Pedi favores e Deus me deu oportunidades.

Não recebi nada do que queria; recebi tudo que precisava.

Faltou falar da pia cheia. O pai aposentado que já dormia para trabalhar no dia seguinte das 7 às 18, e a televisão ligada no programa de venda de jóias, que a mãe do joelho praticamente quebrado assistia. Ambos completaram 65 anos nesse ano. Eles não receberam nada do que queriam.





Comunidade das Mulheres


"Mas vós, comunistas, quereis introduzir a comunidade das mulheres, grita-nos toda a burguesia em coro.

O burguês vê na mulher um mero instrumento de produção. Ouve dizer que os instrumentos de produção devem ser explorados comunitariamente, e naturalmente não pode pensar senão que a comunidade virá igualmente a ser o destino das mulheres.

Não suspeita que se trata precisamente de suprimir a posição das mulheres como meros instrumentos de produção.

De resto, não há nada mais ridículo do que a moralíssima indignação dos nossos burgueses acerca da pretensa comunidade oficial de mulheres dos comunistas. Os comunistas não precisam de introduzir a comunidade de mulheres; ela existiu quase sempre.

Os nossos burgueses, não contentes com o facto de que as mulheres e as filhas dos seus proletários estão à sua disposição, para nem sequer falar da prostituição oficial, acham um prazer capital em seduzir as esposas uns dos outros.

O casamento burguês é na realidade a comunidade das esposas. Quando muito poder-se-ia censurar aos comunistas quererem introduzir uma comunidade de mulheres franca, oficial, onde há uma hipocritamente escondida. É de resto evidente que com a supressão das relações de produção actuais desaparece também a comunidade de mulheres que dela decorre, ou seja, a prostituição oficial e não oficial."

in Manifesto Comunista (2. Proletários e Comunistas)

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Sobre a Mostra do Coletivo Cinefusão: a vingança contra o cinema desertor.


O artista amador, sendo também um desertor, não tem os limites que o artista profissional tem. Não precisa prestar contas, não precisa agradar ao chefe ou ao jurado do edital, não precisa adequar seu trabalho às graças dos patrocinadores nem mudar sua estética para se conformar à expectativa dos curadores. O artista amador encontra o público porque quer, não porque precisa do dinheiro dele e por isso mesmo é capaz de confrontá-lo e desafiá-lo. O artista amador luta por políticas públicas porque quer mudar o modo como as coisas são feitas, não porque esta é sua única forma mais ou menos limpa de subsistência. Mas o artista amador, por outro lado, tem poucos recursos (tempo, dinheiro, meios de produção).

Ou, como disse Edward Said (em Representations of the Intelectual): "Todas estas pressões [exercidas sobre o intelectual e o artista] podem ser combatidas por aquilo que eu chamarei de amadorismo, o desejo de ser movido não pelo lucro ou recompensa mas por amor e enorme interesse em ter uma visão mais ampla, fazer conexões entre linhas e barreiras, em recusar ser ligado à especialidade, em levar idéias e valores apesar das restrições de uma profissão".

Sobre tudo, há dois tipos de artista amador: os que entendem que o melhor modo de realizar sua arte é com a paixão e liberdade que conservam sua auto-disciplina; e os que orientam seu trabalho pela busca da chancela dos jurados e curadores, e do dinheiro dos prêmios e festivais para considerar-se um profissional - e de preferência, um profissional "renomado".

Parece claro que o coletivo cinefusão é um grupo amador de artistas que escolheram a linguagem audio-visual como seu meio e têm um compromisso com a mudança do sistema de metabolismo social injusto e opressor em que vivemos. Ou, como disse um membro da audiência que compunha sua última mostra na cinemateca brasileira, são "revoltadinhos sem verba". A estética imposta pelo "sem verba" e os temas "revoltadinhos" realmente incomodam a classe média, e esta quando resolve abrir a boca, incomoda quem pensa. Mas nem esta estética, nem estes temas, girando em torno de obras documentais e de registros feitos em greves e passeatas de movimentos políticos, são capazes de incomodar a burguesia. Esta, com o controle do Estado, chega ao ponto de abrir seus espaços e disponibilizar uma parte (ainda que ínfima) de sua verba para que grupos de esquerda façam seu trabalho.

Feliz é o cantor, que para cantar só precisa de sua própria voz. Cinema é muito caro. Ainda que hoje até um bom celular seja capaz de entregar mais qualidade de registro audio-visual e pela internet sejamos capazes de alcançar uma audiência maior do que gênios como Chaplin podiam em sua época, em contraste, as produções de hollywood fazem tudo que não custou milhões de dólares parecer… amador.

Mas "internet is for porn". E parece que na indústria pornô a demanda por filmes amadores é maior do que a de filmes bem produzidos. Isso porque diferentemente de outros gêneros o consumidor da pornografia não quer ver um filme, ele quer ver sexo. Ele não quer ver o sexo real, mas uma representação de um roteiro único, de um mesmo, velho e batido tema e suas variações. Linha de produção. Cada erro é uma prova de que a cena é "real", já que em uma produção profissional estes erros não aconteceriam ou seriam cortados. E os produtores realizam filmes cheios de erros, com equipamentos baratos, para representar um registro documental.

A mostra do coletivo cinefusão faz parecer que entre os espectadores de esquerda há uma demanda parecida. Desde a manifestação de atores com tampas de privada na cabeça ao som de uma (ótima) atriz desafinando por causa da necessidade de cantar com mais intensidade do que deveria e dos instrumentos passando por uma caixa rachando pelo mesmo motivo até a colagem de retratos insuportavelmente violentos da barbárie que é exibida, assim como os filmes pornográficos, com fácil acesso de todos na internet, é sobre esta malha, neste tecido de representações que o espectador de esquerda faz da realidade que o coletivo trabalha. Mas qual é o valor de representar em um cinema um ato político que já se foi, se não para dar aos militantes de esquerda o prazer de rever a si mesmos, hora com orgulho, hora com vergonha, como o vídeo familiar de uma festa de aniversário?

A mostra foi além dos filmes lírico-político-documentais como estes, mostrando também obras bem bonitas feitas com atores a partir de um roteiro. Estes mostram artistas jovens em uma atitude amadora. Mas, sem usar da violenta liberdade que um amador poderia, parecem querer mostrar-se profissionais. Parecem querer fazer o que os cineastas consagrados já fazem. E, por mais bonitos que sejam os filmes, com cenas poéticas e tocantes como aquela de uma pipa agonizante, um amor distante, uma moça que só quer saber da vara de seu violino, por semelhança com seus pares profissionais, parecem menores.

Nesta mostra, uma experiência muito interessante e necessária em um espaço como a cinemateca brasileira, um filme se destacou. Adriana Beatriz Barbosa, uma chica mexicana, tocada pelo modo como sua cultura foi virada em terras tupiniquins, mescla cenas de ¡Que viva México! de Sergei Eisenstein e aproveita os próprios procedimentos do diretor soviético para fazer uma montagem que mostra a apropriação que a indústria cultural faz da cultura, tirando o significado de tudo para transformar em mercadoria fria. Ela canta a sua aldeia e se faz universal. O contraste dialético é deflagrado: os mortos do México de Eisestein estão vivos, os vivos do México da chica estão mortos. Danilo Santos mostra atores na rua dizendo o contrário: eu sou vida, eu não sou morte. Bruno Mello Castanho mostra a morte dos meninos-pipa de caem luciféricos todos os dias demitidos do céu. Em uma sociedade como a que nós vivemos, amor, só de longe, já que, como diz Adorno em Minima Moralia, "para o Intelectual [e para o artista] o inviolável isolamento é agora o único modo de mostrar alguma medida de solidariedade. Toda colaboração, todo humano digno de mistura social e participação, meramente mascara a aceitação tácita da inumanidade. É o sofrimento do homem que deveria ser compartilhado: o menor passo em direção aos seus prazeres é um passo em direção ao endurecimento de suas dores", exatamente como os massacres e o linchamento exibidos no filme Dado de Realidade fazem. É o jogo que o artista tem que jogar.

E novamente Adorno: "alguns precisam jogar o jogo porque de outra forma não podem viver e aqueles que poderiam viver de outra forma são mantidos de fora porque não querem jogar o jogo. É como se a classe da qual estes intelectuais [e artistas] independentes desertaram fizessem sua vingança, impondo suas demandas exatamente no próprio domínio em que o desertor procura refúgio".

Foi nos gritos e o sangue-nos-olhos dos membros do coletivo enquanto liam suas cartas e manifestos ao vivo para a platéia, mais do que em seus filmes exibidos, que ficou claro o potencial explosivo e revolucionário que têm - desde que tenham coragem de abandonar a idéia de que não são capazes de fazer sua arte por falta dos recursos de que o cinema "profissional" dispõe, de abandonar os limites impostos pelos jurados e editais, pelos adolescentes de esquerda, pela intelligentsia da USP, pelos seus mestres, e arquem com as conseqüências de abraçar o seu próprio cinema.

Gilberto Alves Jr, 1 de outubro de 2012

ATUALIDADES - CARTA DE GLAUBER ROCHA A JOAQUIM PEDRO



Querido Joaquim,

Espero que nossa amizade continue quente – como da última vez que nos vimos aí no ap. de Ipanema.

Eu e a Paula gostamos muito de você e Krystina e temos saudades. Espero que tenha lido meu livro... Espero com ansiedade O Homem do Pau Brazyl. Vem a Veneza?

Escrevo-lhe porque ontem sonhei acordado num barato com Os Inconfidentes. Revi todo o filme e gostei muito. Quando vi na RAI, em 1972, não gostei. Extranho... o cinema penetra no computador da memória e é possível, anos depois, rever um filme... Sinto-me Tyradentes? Não sei...

Disseram-me que você teve dificuldades na produção...

Cacá escreveu-me, esteve por aqui depois de Cannes, Marcos Faria mandou-me o nº da Revista Luz & Ação. Gustavo telefonou-me. Creio que devemos nos REUNIR outra vez, acima dos grilos psicológicos pequeno-burguêses. UNIDOS somos fortes e fazemos o melhor cinema do mundo. Separados, somos fracos, e deixamos o espaço descoberto pelas forças reacionárias.

A Europa marcha para o socialismo, com a subida de Mitterand “c´est la lumière sur le fin de ciecle”...(sic). E o Brazyl? Partidos políticos VAZIOS, líderes sociais-democratas capitalistas, esquerda fragmentada, sectária e colonizada, tudo como há 20 anos, tudo como nos tempos de Janio...

Nosso grupo ao qual me refiro no livro com admiração e entusiasmo, foi dividido durante a Ditadura de Medici e por motivos neuróticos e políticos que tiveram seus lugares há 10 anos mas que agora devem ser expulsos em nome de novas perspectivas revolucionárias.

Sei que você não se dá com o Cacá, com o Gustavo e com o L. Carlos mas sugiro uma pausa cristã e mineira no sentido de restabelecer o diálogo com os irmãos. Também briguei, perdi minha irmã, sofri campanhas mas a vida de Sto. Agostinho foi pior. Todos nós – você, Leon, Cacá, Gustavo, David, Paulo César, Mario Carneiro, eu, Nelson, Jabor, Luiz Carlos e outros somos imprescindíveis na luta pela independência política e cultural do Brazyl e do III Mundo porque fazemos cinema – o que é exercer grande poder nas áreas subdesenvolvidas. O cinema capitalista é lazer. O cinema revolucionário é subversão. Confundiu-se “objetivos comerciais” “com objetivos culturais”. A “luta pelo mercado” é uma hipócrita máscara à “luta pelo lucro” e com SEXO. Aí temos a chanchada pornográfica e populista. E a revolução? Convive com a prostituição? TV não é concorrente. A TV está nascendo no Brasil. Não acabou com o Cinema no resto do mundo. Os problemas são falsos. Abaixo Cinema de “melodrama”. Abaixo Cinema idealista ficcional! Abaixo a montagem narrativa realista teatral! Somente a Revolução Ideológica e formal poderá desalienar nossa cultura. Mais tarde a TV divulgará as grandes Obras, julgadas “difíceis” pelos burocratas dos partidos, críticos colonizados e intelectuais subdesenvolvidos. Nossa missão política é religiosa, por isto não podemos nos dar ao luxo histérico e estéril de romper nossa unidade em nome de visões personalistas, românticas, narcisistas, burguesas enfim.

A Cooperativa deverá ser a Assembléia onde o Cinema Novo se reúne, ampliando os quadros, como um Partido Político. É necessário abrir a luta ideológica no seio do Partido (Cooperativa & Cinema Novo) e a partir de um Projeto Revolucionário colocar as necessidades diante da Embrafilme. Acabou o período pessedista. É necessário um período de movimentação política fundamentada na unidade do Partido do Cinema, núcleo de um futuro Partido de Intelectuais. O Caos da Embrafilme não se resolverá a não ser de uma discussão ideológica que proponha alguma coisa melhor. Ninguém tem o direito de ser burro, cínico, hipócrita ou vigarista. Chega de sacanagem! O País é nosso e não vamos deixá-lo aos abutres. Escreva-me para Hotel Central – Sintra – Portugal. 

Um abraço e beijos a você, Kristina e família.
Glauber (e Paula)

PS: Telefone a Gustavo, Leon, Cacá, Nelson... Luz & Ação.

carta retirada do site http://www.filmesdoserro.com.br

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

"Se a vida por um momento se torna arte, o mundo muda e mudar o mundo é a grande utopia"

Amanhã, estaremos na cinemateca exibindo 9 fimes.

Mais do que uma mostra do nosso coletivo cinefusão, é importante que ocupemos aquele espaço, afim de retormar o debate de um cinema, de uma arte, vista por outra via. Em suma, de uma arte de verdadeiro caráter público.
Sabemos bem sobre o como a arte sempre foi e sempre será um trabalho improdutivo na sociedade capitalista. Falo de uma arte que se propõe quase de forma suicida de ser um contraponto à medíocre vida que temos, que nos faz destruirmo-nos um pouco a cada dia.
Falo de uma arte que insiste em mostrar que (sim!) o mundo pode ser visto por outra via, e como escreveu Abreu*, "Se a vida por um momento se torna arte, o mundo muda e mudar o mundo é a grande utopia".
Acima de tudo convocamos a todos para mais uma pequena ocupação de um espaço tão importante e, onde, devemos mostrar que podemos e queremos estar.
Trata-se de mais uma batalha pelo simbólico, que assim como todos os outros planos da cultura, de nossas vidas, foram brutalmente tomados, tranformados, vendidos e classificados.
Mais do que tudo, convocamos  todos  a discutir, a ocupar, a usufruir daquilo que nunca deveria ter deixado de ser público.
 

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Coletivo CineEfusão exibe 9 curtas na Cinemateca Brasileira




Evento no facebook: http://www.facebook.com/events/404996796234468/



Num lugar, na terra do sol, onde já morou deus e o diabo, o nosso cinema é arma. Perguntem sobre uma arte nova e respondemos com a única palavra que interessa: RUPTURA.

Falar em anti-cinema não é fetiche, é compreender o nosso tempo. Estamos à margem. É esta a nossa condição.

No dia 28 de setemebro, a partir das 20h15, convidamos a todos para uma mostra de curtas do Coletivo CineEfusão, na Cinemateca Brasileira. Exibiremos 9 filmes que representam um panorama da pesquisa de linguagem realizada pelo grupo desde seu início em 2008.

A ideia é que, a partir disso, criemos um espaço contínuo de debate político e estético, entre diversos grupos e artistas, em torno das questões cruciais para o desenvolvilmento da linguagem cinematográfica e da cultura em geral, que está cada vez mais mercantilizada e privatizada.

Serão exibidos os seguintes filmes:

"Antes que o Amor se Vá" (2009. Direção: Danilo J. Santos)
"Cerol" (2009 Direção. Bruno Mello Castanho)
"Quinteto de Cordas" (2010. Direção: Bruno Mello Castanho)
"Eu Não Sou Morte" (2011. Direção Danilo J. Santos)
"A Mais Perfeita União" (2012. Direção: Danilo J. Santos)
"Trajetória até Aqui: Assunto Poesia" (2012. Direção: Florêncio Guerra)
"Rompe o Disfarce Por Inteiro" (2012. Direção: Florêncio Guerra)
"En El Día de la Batalla de Puebla" (2012. Direção: Adriana Beatriz Barbosa)
"Dado de Realidade" (2012)
Filme convidado: "Entre nós, o dinheiro" de Renan Rovida


28 DE SETEMBRO, SEXTA-FEIRA, 20H15
CINEMATECA BRASILEIRA
Largo Senador Raul Cardoso, 207 - Vila Clementino 

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Tempo Feliz

Poema Brasileiro

Poema Brasileiro

No Piauí de cada 100 crianças que nascem
78 morrem antes de completar 8 anos de idade

No Piauí
de cada 100 crianças que nascem
78 morrem antes de completar 8 anos de idade

No Piauí
de cada 100 crianças
que nascem
78 morrem
antes
de completar
8 anos de idade

antes de completar 8 anos de idade
antes de completar 8 anos de idade
antes de completar 8 anos de idade
antes de completar 8 anos de idade



(Ferreira Gullar, 1962)

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Curta Temporada de "Ópera dos Vivos", da Cia do Latão


Via Crucys à Brazyleira

Habilite as imagens.

Terça-feira ,11 de setembro de 2012 às 20h30, o Núcleo Py da Cia Antropofágica, estréia Via Crucys à Brazyleira, obra livremente inspirada n’O Pagador de Promessas de Dias Gomes, que revisita a história de Zé-do-Burro a partir de pesquisas sobre a República brasileira. Através de uma linguagem épico-surreal, a peça traz temas como religião e reforma agrária, a fim de elucidar um processo no qual muitas movimentações sociais e populares são criminalizadas como atos terroristas.
Espaço Cultural Pyndorama – 40 lugares
Temporada: 11 de setembro a 30 de outubro de 2012
Apresentações: Terça-feira, 20h30 
Informações: (11) 3871-0373 
Recomendação etária: 16 anos


segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Rua Florada, Sem Saída

Está em cartaz de 18 a 23 de setembro o espetáculo "Rua Florada, Sem Saída", do grupo Casa da Tia Siré.

O espetáculo narra trajetória e o crescimento de quatro crianças dentro de um mundo onde crescer não é só um percurso natural , biológico, mas uma determinação da sociedade de consumo - ou simplesmente do capitalismo. Aos poucos absorvidos por este mundo, o que restam deles?

Está em cartaz no teatro de arena, dentro do projeto de ocupação da Cia do Latão, 11h da manha, aos sábados e domingos.

Um infanto-juvenil completamente necessário para todas as idades.

A entrada é gratuita!


sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Trotsky e a imensa onda

“Épocas reacionárias como a nossa própria não apenas desintegram e enfraquecem a classe trabalhadora e sua vanguarda, mas também rebaixa o nível ideológico geral do movimento e atrasa o pensamento político a estágios há muito tempo já superados. Nestas condições, a tarefa da vanguarda é, mais que tudo, não se deixar levar pela onda reacionária: deve-se nadar contra a corrente. Se uma relação de forças desfavorável impede de manter uma posição que foi vitoriosa, deve-se ao menos manter suas posições ideológicas, porque nelas está expressa a cara experiência adquirida no passado. Os tolos considerarão esta política “sectária”. Atualmente este é o único caminho de preparação para uma nova imensa onda adiante que virá com a maré”.

“Grandes derrotas políticas inevitavelmente provocam a reconsideração de valores, geralmente ocorrendo em duas direções. Por um lado a verdadeira vanguarda, enriquecida pela experiência da derrota, defende com unhas e dentes as heranças do pensamento revolucionário e nesta base tenta educar novos quadros para as lutas de massas que virão. Por outro lado, os rotineiros, centristas e diletantes, amedrontados pela derrota, fazem o melhor para destruir a autoridade da tradição revolucionária e andar para trás em sua busca por um 'Novo Mundo'.” (Trotsky, Estalinismo e Bolchevismo, lembrado pelo artigo Leon Trotsky: o homem e suas ideias)

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Notas de trabalho: A cena dura dois pedaços de pizza, duas cervejas e um raspar de coxas

Vestido à moda depressivo estacionou na primeira padaria de esquina Não importava se era cara De qualquer forma era só mais um jeito de se distrair até a hora de voltar para casa e dormir Pediu um pedaço de pizza Uma cerveja Sentiu raspar as coxas Pediu outro pedaço de pizza Outra cerveja Sentiu raspar as coxas A massa do segundo pedaço estava crua Por um momento lhe caiu a ficha Pagava pela pizza Pelo chopp e tinha por direito Reclamar Mordeu e pediu outro pedaço Um angolano ao seu lado falava Não ligava Pagou não se importou quanto Enfiou a nota da compra no bolso como se não fizesse diferença não tê-a impresso Ainda restava tempo até a hora de dormir Caminhou por alguns quilômetros Procurando uma banca de revistas Não havia Em sua cabeça que já não fazia tanta questão de funcionar perguntou-se por um momento como um bairro burguês viveria sem leitura cigarros e uma boa putaria de quinta nas revistas Caminhou E nada Invejou por um momento o burguês que atravessava a rua com seu dalmata De certo depois do passeio chegaria em casa Tomaria um chá Daria um beijo em sua filha pré-adolescente Então deitaria Esse tem sorte atingiu o estágio cujo seus problemas são mediados por qualquer outra pessoa que não ele Não tem com o que se preocupar Tem uma família Talvez creia em deus Talvez não Talvez escreva DEUS com letra maiúscula Deve gostar de trabalhar Ou de ganhar dinheiro De juntar dinheiro Mas como vive sem uma banca de revistas durantes À noite Talvez porque burgueses não leiam durante a noite Porque dormem Os que não dormem geralmente não leem O homem e o cachorro continuaram andando Sentiu inveja do bocejo saudável do homem Sentiu Porque provavelmente o sono daquele homem era provavelmente um descanso

BLACK SABBATH - PARIS 1970






segunda-feira, 20 de agosto de 2012

O incrível mensalão


A HISTÓRIA DO SUPER-ESCÂNDALO QUE ABALOU O MUNDO POLÍTICO E FEZ TREMER O GOVERNO LULA  
ARTE: Angeli
ROTEIRO: Mario Cesar Carvalho
EDIÇÃO: Diogo Bercito

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/61728-o-incrivel-mensalao.shtml


segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Roda Viva: Marcelo freixo

Violeta se fue a los cielos

O filme narra a história de Violeta Parra. A narrativa fragmentada, intercala os tempos históricos de Violeta, de modo que  amplia a crise pessoal da personagem para a desgraça social que então levou a formação de seu caráter, e, dialéticamente, construiu seu trabalho e seu olhar da arte para o mundo. Mas do que isso, o filme é extremamente importante, sobretudo, porque desenvolve e constrói relações para além da beleza, e do regimento burguês, tudo isso, obviamente, materializado pela grande mulher que foi Violeta Parra. 



Violeta se fue a los cielos from Cristián Cataldo on Vimeo.

domingo, 12 de agosto de 2012

Na luta de classes, não há catarse que salve a arte

Uma das discussões mais comuns dentro do despolitizado e individualista mundo do cinema - e no cineEfusão-, são os novos mecanismos de financiamento para a realização de filmes. Além das possibilidades de captação através da isenção fiscal, atualmente "novas" formas foram criadas e  propagam o mesmo problema das leis de isenção: o repasse da responsabilidade do estado para meios privados.

Essas novas-velhas formas se materializam através de sites, onde qualquer pessoa tem livre a possibilidade de inscrever seu projeto, colocar quanto é necessário para ser produzido, e enfim esperar as doações (É claro, esses mecanismos surgem na total, ou quase total, falta de politicas publicas para cultura). Assim como uma equivocada ideia de que ao, mais uma vez, negar, também, as leis de isenção fiscal, estariam lutando contra a miséria da cultura em âmbito público e privado. Contudo, quando aderimos a este mecanismo, já não necessariamente criamos um frente combativa em relação à bancarrota cultural, mas mais uma vez isentamos o estado de sua obrigação, afirmando que temos, e podemos criar nossas próprias formas de financimento. Isto, talvez, seja dos males o menor, o pior de tudo é que do ponto vista politico-estratégico cometemos um retrocesso absoluto, quando ao invés de revindicarmos um novo modelo de politca cultural, de forma organizada junto à categoria, criamos novas formas de luta, repassamos a responsabilidade de levar a arte ao povo, assim como saúde, educação, etc., para o individuo. 

Depois de lutas tão intensas e organizadas que culminaram desde movimentos sociais, até o "arte contra barbárie"* que conseguiu lutar e enfim ter uma lei de caráter realmente público - ainda cheia de problemas e muito longe de alguma solução - para o teatro na cidade de São Paulo, e, mais importante, afirmando, sempre, que "a Cultura é o elemento de união de um povo que pode fornecer-lhe dignidade... É tão fundamental quanto a Saúde, o Transporte e a Educação. É, portanto, prioridade do Estado"; dizer sim a esta nova forma de auto-financiamento, sem criticas, sem organização, sem estratégias e táticas coletivas, seria dizer não à história e as conquistas dentro de um trabalho politico na cultura contra  uma sociedade cada vez mais brutalizada e mercantilizada.

Nada contra uma ferramenta de auto-financiamento num afunilamento de luta de classes, onde o conflito está tão nítido e demarcado, que o estado não só se negaria ( como o é) a financiar os não-cirque du soleil, ou os não-xuxa, mas fecharia os teatros,  perseguiria seus artistas, etc...

Talvez, o exemplo seja meio infantil, mas uma coisa é certa, antes de qualquer atitude desmedida, deveríamos reconhecer primeiro que nossos surtos e ações impensadas em relação à miséria atual da cultura, da arte e sobretudo do cinema, são, antes de mais nada, fruto de um uma construção social, politica, econômica, filosófica, que só nos ensinou a sonhar no singular. 

Para quem chegou até aqui um trecho do livro sobre a história da lei de fomento ao teatro em São Paulo, escrito por Iná Camargo Costa e Dagoberto. Trata-se do primeiro manifesto do movimento arte contra barbárie.

Um final em tom de alivio, e com uma boa leitura, já que meus títulos ainda são muito melhores que meus textos.

"ARTE CONTRA A BARBÁRIE
Os grupos teatrais Companhia do Latão, Folias D'Arte, Parlapatões, Pia Fraus, Tapa, União e Olho Vivo, Monte Azul e os artistas Aimar Labaki, Beto Andretta, Carlos Francisco Rodrigues, César Vieira, Eduardo Tolentino, Fernando Peixoto, Gianni Ratto, Hugo Possolo, Marco Antonio Rodrigues, Reinaldo Maia, Sérgio de Carvalho, Tadeu de Sousa e Umberto Magnani, vêm a público declarar sua posição em relação à questão Cultural no Brasil:

O Teatro é uma forma de arte cuja especificidade a torna insubstituível como registro, difusão e reflexão do imaginário de um povo.


Sua condição atual reflete uma situação social e política grave.

É inaceitável a mercantilização imposta à Cultura no país, na qual predomina uma política de eventos.

É fundamental a existência de um processo continuado de trabalho e pesquisa artística.
Nosso compromisso ético é com a função social da arte.

A produção, circulação e fruição dos bens culturais é um direito constitucional, que não tem sido respeitado.

Uma visão mercadológica transforma a obra de arte em produto "cultural". E cria uma série de ilusões que mascaram a realidade da produção cultural no Brasil de hoje.

A atual política oficial, que transfere a responsabilidade do fomento à produção cultural para a iniciativa privada, mascara a omissão que transforma os órgãos públicos em meros intermediários de negócios.

A aparente quantidade de eventos faz supor uma efervescência, mas, na verdade, disfarça a miséria dos investimentos culturais de longo prazo que visem à qualidade da produção artística.

A maior das ilusões é supor a existência de um mercado. Não há mecanismos regulares de circulação de espetáculos no Brasil. A produção teatral é descontínua e no máximo gera subemprego.

Hoje, a política oficial deixou a Cultura restrita ao mero comércio do entretenimento. O Teatro não pode ser tratado sob a ótica economicista.

A Cultura é o elemento de união de um povo que pode fornecer-lhe dignidade e o próprio sentido de nação. É tão fundamental quanto a Saúde, o Transporte e a Educação. É, portanto, prioridade do Estado.

Torna-se imprescindível uma política cultural estável para a atividade teatral. Para isso, são necessárias, de imediato, ações no sentido de:

Definição da estrutura, do funcionamento e da distribuição de verbas dos órgãos públicos voltados à Cultura. 

Apoio constante a manutenção dos diversos grupos de Teatro do país. 


Política regional de viabilização de acesso do público aos espetáculos.
Fomento à formulação de uma dramaturgia nacional. 


Criação de mecanismos estáveis e permanentes de fomento à pesquisa e experimentação teatral. 


Recursos e políticas permanentes para a construção, manutenção e ocupação dos Teatros públicos. 


Criação de programas planejados de circulação de espetáculos pelo país.


Este texto é expressão do compromisso e responsabilidade histórica de seus signatários com a idéia de uma prática artística e política que se contraponha às diversas faces da barbárie - oficial e não oficial - que forjaram e forjam um país que não corresponde aos ideais e ao potencial do povo Brasileiro. "

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Exercício Videográfico - Dogma Latão

Exercício videográfico realizado pelo Núcleo de estudos Anatol Rosenfeld dentro da ocupação do teatro de Arena pela Companhia do Latão.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Arte, conhecimento e ideologia

Durante muito tempo o conhecimento positivista colocou arte, junto à filosofia, religião, empirismo, como conhecimentos menores, todo inferiores em relação à ciência.

Edgard Morin, filósofo contrário à ideia cartesiana, de dividir para aprender, foi uma das frentes que defendiam (ou defendem) a arte como meio de conhecimento, por onde podemos acessar a universalidade das relações humanas em uma sociedade.

De alguma forma, a arte não só analisa, critica, a sociedade e sua história mas antecipa acontecimentos. Como é o caso de Flash Gordon. Surgiu pela primeira vez em 1934, nos jornais, desenhado por Alex Raymond. O desenho antecipou, por exemplo, o forno microondas. Diferente do criador de "Buck Rogers", em Flash Gordon, o autor não contava com a consultoria de uma equipe de cientistas. A Nasa chegou admitir num boletim oficial que as histórias em quadrinhos do personagem foram usadas para solucionar problemas de suas cosmonaves.


quinta-feira, 19 de julho de 2012

"Meu Nome é Yuba", de Bruno Mello Castanho (do Coletivo Cinefusão) na Cinemateca Brasileira esta sexta



Programa permanente dedicado à difusão de filmes brasileiros de média e longa-metragem inéditos no circuito comercial, o PRIMEIRA EXIBIÇÃO oferece aos realizadores um espaço para a projeção de seus novos filmes e permite que o público entre em contato, em primeira mão, com a produção audiovisual independente. Em julho, a atração é o filme Meu nome é Yuba, de Bruno Mello Castanho e Juliana Kirihata. O média-metragem retrata a vida de moradores da comunidade Yuba, em Mirandópolis (SP), onde cerca de 70 imigrantes japoneses mantém suas tradições culturais. Realizadores interessados em exibir seu filme nas sessões mensais do projeto podem enviar seu pedido para o e-mail programacao@cinemateca.org.br


CINEMATECA BRASILEIRA
Largo Senador Raul Cardoso, 207
próxima ao Metrô Vila Mariana
Outras informações: (11) 3512-6111 (ramal 215)
Ingressos: R$ 8,00 (inteira) / R$ 4,00 (meia-entrada)
Maiores de 60 anos e estudantes do Ensino Fundamental e Médio de escolas públicas têm direito à entrada gratuita mediante a apresentação de documento.


PROGRAMAÇÃO
20.07 | SEXTA
SALA CINEMATECA BNDES
20h30 MEU NOME É YUBA


FICHA TÉCNICA E SINOPSE
Meu nome é Yuba, de Bruno Mello Castanho e Juliana Kirihata
São Paulo, 2007, DV, cor, 60’
A vida dos moradores da Comunidade Yuba, em Mirandópolis, no interior de São Paulo. Isamu Yuba chegou ao Brasil em 1926 e em 1933, junto com alguns companheiros, começou a construção de uma fazenda comunitária. O filme retrata a singularidade da vida dos habitantes que vivem em Yuba, onde preservam a cultura japonesa, trabalhando de forma comunitária.
Livre
sex 20 20h30