O Coletivo Cinefusão surge, no final de 2008, a partir da iniciativa de trabalhadores de diversas áreas - cinema, jornalismo, publicidade, artes cênicas, filosofia, arquitetura, fotografia -, empenhados em criar primeiramente uma rede colaborativa que pudesse dar conta da junção dessas linguagens e também da possibilidade de abarcar potencialidades em busca de produção artística independente, mas também de reflexões concretas acerca da sociedade. É principalmente sobre este último pilar de atuação política, que o grupo vem, atualmente, pensando o cinema, sempre vinculado a outras expressões artísticas e movimentos sociais.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Atuação crítica: A utopia segundo Chico de Oliveira


Trecho da entrevista com Chico de Oliveira para o Livro "Atuação Crítica", de Sergio de Carvalho e outros colaboradores.


"[...] Na verdade, o que eu estou querendo dizer é o seguinte: no mundo da mercadoria, a pior coisa que pode acontecer a alguém é não ser mercadoria. Não se pode fazer uma análise histórico-sociológica rigorosa que seja despregada do tempo, como se nós existíssemos sem a racionalidade burguesa. Isto seria uma forma de pensamento idealista. Você tem que sentar a bunda e comparar. Se você foi criado pela racionalidade burguesa ocidental, você está imerso nela. É ilusão pensar que a nossa sociabilidade é herdada da tribalidade indígena ou ancestralidade africana. Os elementos que persistiram dessa sociabilidade não estruturam a forma de relação social. Agora, se as categorias de racionalidade burguesa não foram socialmente  construídas no seu interior, esse é o pior pesadelo que pode acontecer. O segundo passo, no qual é preciso prestar atenção, é verificar que não se pode mais alcançar estas categorias. É mostrar que toda vez que se tenta realizar o projeto burguês nas condições em que a periferia foi formada, isso dá em totalitarismo. Numa sociedade que não tem autonomia, que não tem mercado, quando se proclama "a regra agora é a do mercado", tem início o totalitarismo. E por isso se coloca o projeto utópico: a sua obrigação é, por via da racionalidade burguesa, ultrapassá-la. A utopia passa a ser o movimento de dizer que toda vez que a burguesia tenta atender aos interesses de todo mundo  - girando em torno de categorias como lucro, competitividade e iniciativa individual - isso não vai ser possível, e e ela vai se tornar totalitária. Porque as condições concretas da sociedade fazem com que isso seja uma operação de destruição e não de criação. Mas não se dá o segundo passo sem o primeiro. Sem explorar as virtualidades criadas pelo campo do capitalismo, você não tem nem pensamento utópico. Você precisa antes desmontar. Uma coisa é ter pensamento utópico, a outra coisa é ser idealista e apenas dizer "vamos fazer uma mundo melhor". A utopia é sempre uma crítica radical."

Greve! Deveria ser votada?


Republiquei este texto, sobretudo, por conta das infelizes, mas não surpreendentes, declarações do governador de Sâo Paulo sobre a greve dos metroviários. Entre todos os absurdos, o que ainda faz morder os cotovelos é a acusação - não só do governador, mas globo, etc - pelo não cumprimento da ordem judicial que determina como deve ser feita a greve. Os trabalhadores imersos à toda merda-capital, reduzem, equivocado e inevitavelmente, e direcionam toda sua raiva aos grevistas, e buscam possibilidades de acordo com o patrão; e neste último ponto, uma semelhança à situação dos sindicatos, que lutam por reforçar a imagem de esforço pela conciliação, e deixar claro que a briga não é politica:


Greve!   Deveria ser votada?


"[...] as aspirações e as expectativas populares são variadas, contraditórias, frequentemente, divididas entre . uma exigência de liberdade e uma demanda de segurança A função específica da política consiste em articulá-las e conjugá-las por meio de um futuro histórico cujo fim continua incerto."¹

O que é pior? A decisão de um miserável alimentada de sua urgência, impulsionada unidimensionalmente pelo ímpeto, que tem como fim sua sobrevivência? Ou seria a paciência do saciado, contudo consciente de todas as mazelas dos miseráveis - ou a mazela - e, aparentemente, disposto a erradicá-las?  

Quanto tempo dura um miserável? Quanto tempo seus órgãos suportarão a sede, a fome, a dor, o sexo maquinal? 

Quanto tempo suportará o descalabro da alienação que o corrói? 

Quanto tempo suportará ter sua subjetividade determinada por um sistema econômico?

Hitler transformou uma massa faminta, impetuosa e confusa em nazistas; o governo Lula potencializou o período anti-crítico, que semelhante a ele próprio, se coloca como fim da história. Fundou o operário pós-moderno. ( À guisa de embasamento e provocação: Joseph Goebels, Ministro da Propaganda na Alemanha nazista, dizia que não se poderia dominar o povo com/através de argumentos, pois argumentos poderiam ser confrontados no nível do discurso, haveria de atingir onde não pudessem concatenar lógicas de pensamento, ou seja em suas "emoções") 

O governo Lula potencializou e estendeu a vida do miserável; viverá miseravelmente, durante muito tempo.

Como então deixar nas mãos do "consciente paciente da miséria do mundo" o futuro incerto do miserável?

Quanto tempo demora para um sonho ser totalmente destruído? Quanto tempo levará para morrer o sonho do trabalhador que crê uma dia poder escrever uma poesia?


Quanto tempo duram os sem mãe, com filho(s)?

Por quanto tempo permaneceremos "tolos e pobres"²?

A greve representa o rompimento com tudo aquilo que possibilita essas perguntas. Uma greve deve existir uma única vez. Não deve ser como uma festinha que ocorre todo ano. Pois os miseráveis não podem esperar o mesmo tempo que os "inquietos conscientes da miséria". A greve deve atingir o ponto nevrálgico do que vai contra. Deve nascer do estomago ferido do faminto. Deve romper com a caneta do burocrata.

A greve não é um movimento possível, é uma reação prática, uma pronta-resposta, e se objetiva, efetiva e determinante para o definitivo fim de um mal.

Uma greve, sequer deveria ser votada, ela se funda e se auto-explica por uma única razão: um patrão. E onde houver um, eu apoio.

¹ "Os irrdutíveis", Daniel Bensaïd
² Trecho do Discurso de Steve Jobs

segunda-feira, 21 de maio de 2012

"Nova Classe Média?"


Presidente do Ipea analisa em livro a 'nova classe média'

Marcio Porchmann lança "Nova Classe Média?"



Por Caio Zinet

Caros Amigos

Durante a última década, o Brasil vivenciou um intenso fenômeno político e econômico, a ascensão de milhões de pessoas à chamada “nova Classe C”. Para analisar esse novo elemento social brasileiro, o presidente do Instituto de Pesquisa Aplicada (Ipea), Márcio Porchmann, escreveu o livro "Nova Classe Média?" pela editora Boitempo. O livro tem lançamento e debate programados para o dia 29 desse mês de maio, às 19h30, no prédio da Economia da PUC, em São Paulo.

Para o pesquisador há uma disputa sobre o que represente essa nova Classe, principalmente em torno da discussão se ela pertence a um setor da classe média, ou se é um setor da classe trabalhadora. Para ele, essa discussão tem intensas repercussões sobre a atuação e o papel do Estado .

“Se a identidade que nos estamos tendo é a de classe média a pressão para que o Estado subsidie o setor privado tenderá a ser maior. Se nós entendemos que se trata de novos segmentos no interior da classe trabalhadora a pressão é de outra natureza”, afirmou.

Ele traçou ainda um perfil dessas novas pessoas que ascenderam da base da pirâmide social, que pare ele escaparam da influência das instituições políticas democráticas. Para ele isso tem repercussões importantes na política brasileira.



Confira abaixo a entrevista na íntegra.

Caros Amigos - Quais são as principais características dessa nova classe C?

Marcio Porchmann - Ao meu ver todo esse processo não constituiu o surgimento de uma nova classe, pelo contrário são segmentos novos no interior da classe trabalhadora. Essa ascensão tem características muito individualistas, muito movidas pelo próprio consumo. É um segmento especialmente concentrado no setor de serviços, e que as instituições civil-democráticas, como por exemplo, associações de bairro, associações estudantis e de trabalhadores, os próprios partidos políticos, não conseguiram capturar.

Esse segmento ascende, emerge, mas é movido fundamentalmente pelo consumo. Isso é até natural, eu diria. Nós tivermos durante a década de 1970 outro momento de ascensão social importante, especialmente porque durante esse época vivenciamos o chamado “milagre econômico”, quando a economia cresceu em média 10% ao ano. Então houve um forte crescimento econômico que foi puxado pelos empregos na indústria. Nessa época a mobilidade social foi muito forte, porque eram as pessoas que vinham do campo, ainda nos anos 1960 e 1970 havia o campo que não conhecia luz elétrica, água encanada, etc.

Essas pessoas vieram para as grandes cidades basicamente por conta do emprego industrial, só que as cidades brasileiras não estavam preparadas para receber esse fluxo de imigrantes que vinham do campo e do interior do Brasil e com isso as pessoas acabaram indo morar nas favelas, onde não tinham acesso a água encanada, luz elétrica, etc. É dessa época parte significativa das favelas nas grandes cidades do Brasil. Isso gerou um estranhamento, e esse estranhamento na segunda metade dos anos 1970 foi de alguma maneira capturado por instituições que se formaram durante a transição política brasileira, da ditadura para o regime democrático. Instituições como as comunidades eclesiais de base, associações de bairro, o próprio renascimento do movimento estudantil, o renascimento do sindicalismo, a construção dos partidos políticos, e a transição para a democracia, e até mesmo a constituição de 1988 que de certa maneira é fruto do que aconteceu com esse novos segmentos emergentes que eram basicamente classe trabalhadora do ramo industrial. Eles foram protagonistas dessa transição.

O que nos estamos vendo agora é que o setor que é protagonista na geração de emprego nessa primeira do século XXI é o setor de serviços, e aí são postos de trabalho vinculados a atividades de terceirização, por exemplo, atividades temporárias. É um segmento que não tem suas aspirações capturadas pelas instituições democráticas, e isso aponta para um segmento onde justamente uma das características é a baixa escolarização.

É um segmento, que obviamente, depende do desenvolvimento econômico e da geração de empregos. Por outro lado se mostra conservador em outros valores como é o caso da pena de morte, religião, aborto, assim por diante. Então as características desse segmento são até naturais na medida em que não tenham um envolvimento com instituições democráticas. Esse é o desafio, eu diria assim, do movimento estudantil e sindical. Nós tivermos 1 milhão de estudantes de origem humilde que ascenderam ao nível superior por conta do ProUni (Programa Universidade para todos), por exemplo. Então esse segmento que ascendeu, de certa maneira, não foi fortalecer, não foi fazer parte do movimento estudantil, que é uma das instituições importantes da democracia. Em um país que não tem tradição democrática como é o nosso, que é um país que completou agora 50 anos de experiência democrática em 500 anos de história, isso é um fato bastante significativo a ser considerado.

CA - A inserção dessas pessoas se deu pela via do consumo, mas pouco pela via do direito. Quais as consequências disso?

 
MP - Se não tiver a cultura política o que ocorre é que cada um acha que a ascensão dependeu do seu próprio esforço físico, porque afinal de contas foi ele que conseguiu o emprego, esse emprego veio com melhor salário e permitiu a ele ascender socialmente, então dá a perspectiva individualista, porque na verdade está faltando a cultura política. A expansão do emprego foi fruto de uma decisão política de uma nova maioria que se constituiu no país a partir de 2003 que entendeu que o Brasil não poderia mais seguir em uma trajetória de voo de galinha, que cresce um pouco um ano, no outro não crescia, que foi a experiência dos anos 1990.

A falta de uma política leva a esse quadro de uma visão mais individualizada. Ao mesmo tempo esses novos segmentos que ascenderam que são trabalhadores que não poupam, e que têm toda sua renda adicional voltada para o consumo, está sendo visto por alguns como nova classe média. O que está por trás disso é uma disputa sobre como deve ser a atuação do Estado, porque se eu identifico que esses segmentos são de estratos de classe média, o que está por trás disso não é a defesa, por exemplo, de políticas públicas universais. A classe média está preocupada com a educação e a saúde privada, está interessada em uma previdência privada, então isso é uma lógica diferente daqueles que nós poderíamos entender como sendo a de uma classe trabalhadora que está preocupada com políticas universais, como saúde e educação pública de qualidade.

Então esse é o embate que tem repercussões grandes no papel do Estado. Porque se a ideia é de classe média possivelmente a ação do Estado tende a ser cada vez mais dissociada de políticas voltadas para a universalização.

Durante os anos 1990 tinha-se uma clareza que o Estado não era eficiente, de que eficiente era o setor privado. Agora que essa tese, digamos assim, caiu, porque o Estado se mostrou absolutamente necessário. Agora se inicia um debate sobre como o Estado deve atuar, especialmente em termos de políticas públicas. Como se coloca esse dinheiro na sociedade, se é subsidiando a iniciativa privada. A receita federal, por exemplo, subsidia o gasto da saúde privada, da educação privada, da previdência privada, da assistência privada dos segmentos de maior renda no país. Porque quando você declara o imposto de renda pode-se abater do valor devido esse tipo de gasto. Então o Estado brasileiro financia o gasto privado nas áreas de educação, saúde, etc., desses segmentos que declaram imposto de renda, que não são os pobres.

Então se a identidade que nós estamos tendo é a de classe média, a pressão para que o Estado subsidie o setor privado tenderá a ser maior. Se nós entendemos que se trata de novos segmentos no interior da classe trabalhadora a pressão é de outra natureza.

CA - Essa política de crédito é uma política que pode se manter no longo prazo?

MP - A inteligência da política pública desde o início do governo Lula foi de viabilizar maior renda para esses segmentos da base da pirâmide social para ampliar o consumo, e ao ampliar o consumo nós fomos gradualmente ocupando a capacidade ociosa das empresas sem a necessidade de grandes investimentos. Agora estamos em condições mais difíceis para viabilizar essa perspectiva porque já há certa saturação da capacidade ociosa, e o grande desafio colocado é o do investimento, da ampliação da capacidade produtiva para atender as possibilidades de incorporação de novos segmentos, e ao mesmo tempo gerar empregos de classe média tradicional como bancários, professores. Mas isso só virá em grande quantidade com a ampliação nos investimentos, porque com mais investimentos se amplia a capacidade produtiva, o que significa a incorporação de novas tecnologias e a necessidade de incorporação de trabalhadores com maior escolaridade típica de classe média. O desafio, portanto, passa a ser o investimento e parece que o governo brasileiro está inclinado nesse sentido, especialmente quando nós olhamos as medidas mais recentes de reforço do setor produtivo com os subsídios fiscais, a queda na taxa de juros, as medidas de desvalorização da moeda. Esse conjunto de ações muito positivas está culminando para que o investimento produtivo ganhe maior dimensão.

 
CA - As condições de emprego que foram geradas durante a última década são diferentes das que foram geradas durante a década anterior?


MP - De fato o grosso das ocupações geradas foi de remuneração ao redor do salário mínimo, mas eu entendo que foi fundamental a geração desse universo de vagas, porque se nós tivéssemos gerados empregos tradicionais de classe média, esses segmentos que foram beneficiadas não teriam chance de disputar esses postos de trabalho, por terem um perfil em sua maioria de baixa escolaridade e de certa maneira ficariam marginalizados de empregos de maior requisito de contratação. Então é isso que explica o sucesso brasileiro de permitir que a inclusão social fosse o motor principal do próprio dinamismo econômico que inverteu a lógica anterior de crescer para depois distribuir. Para dar continuidade a essa política de mobilidade social é preciso de empregos de maior qualidade.

 
CA - Quais são os principais desafios do governo com relação a esse novo fenômeno?

 
MP - Inegavelmente você entra no tema de reformas, nós temos um padrão de arrecadação de recursos pelo Estado brasileiro que reforça a desigualdade, porque se arrecada fundamentalmente dos pobres e não dos que têm mais dinheiro. O Estado, nesse sentido, mostra que é muito forte para arrecadar dinheiro do pobre, mas é muito fraco para arrecadar dinheiro dos mais ricos. E esse tipo de receita, que é uma receita regressiva, não ajuda a diminuir a desigualdade, pelo contrário. Do ponto de vista do gasto do Estado nós percebemos que também não há um padrão homogêneo de intervenção do Estado. Por exemplo, na área de assistência social eu diria que é um padrão de característica social-democrata porque os segmentos mais pauperizados é que são beneficiados pelas políticas de assistência social. O mesmo não pode-se dizer em relação ao tema cultural, por exemplo. O Estado brasileiro, seja União, governos estaduais ou municipais não coloca os principais aparelhos de cultura na periferia, que é onde o povo pobre está. Os principais aparelhos culturais estão nas áreas mais ricas. Se olhamos do ponto de vista dos bancos, especialmente dos públicos, a presença dos bancos não estão nos pequenos municípios de maneira mais organizada. Nas favelas a mesma realidade. Então nós ainda temos um serviço bancário público em um formato para um segmento de renda um pouco maior. Portanto a reorientação do papel do Estado com esse olhar de enfrentamento da pobreza e da desigualdade é um grande desafio.

A evasão do artista: um trecho de Balzac.

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"Existe para as almas, facilmente expansivas, uma hora deliciosa que sobrevém no instante indeciso, em que ainda não é noite, mas em que já não é dia; a penumbra crepuscular projeta suas tintas imprecisas, ou seus estranhos reflexos, sobre todos os objetos, favorecendo um devaneio que se combina vagamente com os efeitos da luz e da sombra. O silêncio, que quase sempre reina nesse momento, torna-o mais particularmente caro aos artistas que se concentram, se colocam a alguns passos de suas obras, nas quais não podem mais trabalhar, e as julgam, embriagando-se com o assunto cujo sentido íntimo se revela então aos olhos interiores do gênio. 

Aquele que não permaneceu pesativo, junto a um amigo, durante esse momento de sonhos poéticos, dificilmente compreenderá seus indizíveis benefícios. Graças ao claro escuro, os ardis materiais, empregados pela arte, a fim de dar impressão de realidade, desaparecem completamente: se se trata de quadro, as personagens que ele representa parecem falar e caminhar; a sombra torna-se sombra, e o dia, dia, a carne adquire vida, os olhos se movem, o sangue circula nas veias, e os estofos cintilam. 

A imaginação contribui para a realidade de cada detalhe e nada mais vê a não ser a beleza da obra.

É a hora em que a a ilusão reina despoticamente; talvez se erga com a noite! Não é a ilusão, para o pensamento, uma espécie de noite que povoamos de sonhos? A ilusão abre então as asas, transportando a alma para o mundo da fantasia, mundo fértil em caprichos voluptuosos, no qual o artista esquece o mundo positivo, o dia anterior, o dia seguinte, tudo, até mesmo suas misérias, tanto as boas como as más".

(Balzac, A Comédia Humana, A Bolsa - Paris, maio de 1832)

sábado, 19 de maio de 2012

Comunidade Mauá - A história se repete: A política do coturno em prol do capital





Por Bia Abramo: 

"237 famílias ocupam um edifício na Rua Mauá, em São Paulo, desde 2007.  


Transformaram um monte de lixo, abandonado desde 2003, numa alternativa real de moradia para mais de 1,3 mil pessoas. 160 crianças que moram lá estudam em escolas da região da Luz. Ainda assim, um juiz, em tempo recorde, decidiu que moradores estão errados e os proprietários, certos; a PM já está com licença para invadir o prédio e expulsar os moradores. Na terça, 15, os Racionais foram apoiar a Ocupação Mauá e gravaram lá um clipe."


Glauber Rocha Severino e Super-Homem


sexta-feira, 18 de maio de 2012

TRABALHADORES DE CULTURA CONVIDAM PARA UM CAFÉ DE RUA OU ESCULACHO POPULAR.



TRABALHADORES DE CULTURA, EM ESPECIAL GRUPOS DE TEATRO DE SÃO PAULO CONVIDAM PARA UM IMPORTANTE:

CAFÉ DE RUA OU ESCULACHO POPULAR
PARA DISCUTIR O "PROCULTURA" NUM
"AMBIENTE CIVILIZADO" COM PALAVRAS DE ORDEM E "DISCUSSÃO QUALIFICADA"

DIA 19 DE MAIO (SÁBADO)
DAS 10 ÀS 13H
Que fique claro que não estamos com essa Manifestação de Rua e Popular com o intuito de desqualificar a atitude de qualquer entidade se organizar e elaborar suas proposições pro poder público, ação essa mais que legítima.
Este Café de Rua ou Esculacho Popular pretende discutir através de uma grande ASSEMBLÉIA PÚBLICA DE RUA sobre os acordos firmados e construídos durante mais de 8 anos que foram ignorados por esta administração que se comprometeu com a continuidade. É consenso publicado, desde a presidente Dilma ao presidente da FUNARTE Antônio Grassi, que são favoráveis a todas as nossas exigências. Tanta desfaçatez nos faz crer que o Estado é uma estrutura anti-popular e existe em função dos interesses do capital. Um governo que se diz de esquerda, deveria agradecer e fomentar a participação e mobilização popular que são a força motriz na construção de novos paradigmas sociais.
Posto isso, convocamos a todo(a)s os Trabalhadores das Artes em geral para este grande Ato.
Basta de renúncia fiscal na Cultura.
Contra a promiscuidade entre governo e empresários.
SI HAY RENÚNCIA
SOY CONTRA!
Todo trabalhador quando faz arte coloca o mundo às avessas.
Contra a política do coffee break:
Cafézinho popular.
Dia 19 de maio (Sábado) das 10 às 13h
Local: Na Rua Álvares Penteado 151
Centro de São Paulo
(Próximo ao Metrô Sé e São Bento)
Informações:  (11) 7294-9902 / 8121-6554 ou 7293-5387.
Nas proximidades do café / ato teremos as ilustres presenças de representantes do Ministério da Cultura, tais como o Deputado Pedro Eugênio (Atual relator do Procultura) e Secretário-Executivo do Ministério da Cultura Vitor Ortiz.
CADA PARTICIPANTES E OU MILITANTE DEVE LEVAR:
Uma xícara e um pires pro seu café.
COMO TAMBÉM SE COMPROMETER COM OS COMES E BEBES DO DIA, JÁ QUE TRATA-SE DE UMA DISCUSSÃO E CONSTRUÇÃO COLETIVA.
DICAS PRO CARDÁPIO:
Pães, bolos, biscoitos variados, torradinhas, manteiga, requeijão, geléias, açúcar, adoçante, achocolatado, chás, garrafas de café e água quente, frios (presunto, queijo, salame...), sucos, bombons, frutas, iogurte, achocolatado, patê, guardanapos e descartáveis (facas, garfos e pratos).
DOS GRUPOS E MOVIMENTOS TAMBÉM NECESSITAMOS:
Instrumentos musicais, tambores, apitos, mega-fones, caixas de som, faixas, estandartes e muita criatividade.
Compareça e junte-se a todo@s nós!
Por favor, ajudem na divulgação.
É muito importante que venham representantes de todos os grupos e estudantes das artes e culturas em geral.
_______________________________________________________
Que se diga, mais uma vez:
- O que se defende é uma política pública de Estado, e não apenas de governo, estabelecida em leis com regras claras e democráticas, e com orçamentos próprios, o que obrigaria os governos, como Poder Executivo, a executá-las. O que se defende é uma abertura para programas e não um programa único como o incentivo fiscal. O que se defende são leis – a serem construídas no tempo – e não uma lei única como o Procultura. O Prêmio Teatro Brasileiro é um projeto de lei desta natureza e foi entregue ao governo para que ele o encaminhasse ao Congresso Nacional como UM exemplo disso, a ser seguido por outros, e não como um programa único de teatro. Mas o governo finge que não entende isso e não toma nenhuma providência para encaminhá-lo ao Legislativo;
- O que se defende é um Fundo Nacional de Cultura, que não é programa mas um instrumento contábil para a ação dos governos, com orçamento e regras claras estabelecidas em leis; que seja administrado através de editais, que serão sempre refeitos e discutidos, tendo um caráter conjuntural, ao contrário dos programas acima, que têm caráter estrutural e estruturante, caráter de continuidade.
 
O diálogo foi mantido durante anos, nossas pautas continuam sendo dinheiro público para a arte pública. Estão amplamente apresentadas em nossos manifestos, anteriormente divulgados, e claramente organizadas em nossas propostas de leis também apresentadas aos órgãos que compõem o governo.
Aos representantes do  Estado exigimos impacientes que cumpram nossas exigências. 

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Delírios de Leitura.


As palavras do alemão ressoavam no meu cérebro:

“Vêem na miséria apenas a miséria, sem atentar para o aspecto revolucionário subversivo que irá enterrar a velha sociedade”.  

Quanto sentido em duas linhas! Afinal, quem vê? 

Poderia iniciar um comentário “por partes”, expressão que utilizo com relativa frequência. É difícil saber quando certas palavras costumeiras deixam de servir à inteligência, e se tornam muletas.  

Entretanto, porquanto, no entanto, pois é, isto é, quer dizer, então, ou seja, por conseguinte, na ordem do dia, revolução, enfim, etc. etc.”. Qual delas produz maior sensação de conforto mental? O termo menos espinhoso, mais recorrente? Enfim.

Certas palavras são exaustivas. Mas isso é apenas um sintoma, na superfície, de raciocínios exaustivos. Vejamos: quando digo “por partes”, me coloco na posição de um possível leitor. Imagino este, e, ao fazê-lo, lanço mão de recursos estilísticos para atingi-lo.  

Poderia dizer: “vamos por partes”. Mas seria muito pouco intransigente, já que o leitor imaginado - sendo eu mesmo, fora de mim - é um pequeno-burguês, razoavelmente, ou quase instruído.

Reparem como a discussão sobre a utilização de uma certa expressão (mais ou menos reduzida?) em conformidade com um leitor determinado, escorrega para a questão do didatismo.

Noutras palavras: se a expressão não fosse reduzida, o didatismo seria excessivo, para um tipo de leitor que presumimos ser minimamente capaz de andar por suas próprias pernas, levando em conta as condições reais de sua existência.

Mais do que isso: deveria saber que a reflexão por partes é inevitável quando se trata de algo tão complexo como o conceito de miséria... 


Talvez o didatismo, distante do jogo da exploração capitalista, não faça sentido algum. Aliás, deveríamos perguntar se ele pode sequer existir fora disso.   

Assim, as palavras se convertem em muletas em relação a um pensamento que necessita de muletas. De repente, o pensamento empaca: brota a palavra santa, como um milagre, e o raciocínio foi salvo em suas principais linhas de força... Ao abrigo do acaso.
                           
Na criação, na reflexão, quando dependemos de um milagre para evitar o naufrágio, não é isto o sinal de que já estamos naufragados? É óbvio: a linearidade e a regularidade de um processo é uma ilusão que devemos abandonar, tanto mais, então, quando se trata de um processo de contestação do atual estado de coisas.

A obsessão pela estabilidade é um vício burguês - praga que leva a uma duplicação estranha da personalidade.  

Por isso, não dá para confundir as coisas: salto, descontinuidade, alternância de ritmo, etc. é uma coisa. Paralisia é outra.

Vejamos: as palavras são forças produtivas. Nesse sentido - é dureza admitir -, um texto ou um poema mal escrito, desinteressado das questões técnicas, feliz na sua ignorância pacata, constitui, em escala minúscula, uma ação contra-revolucionária.

Em produção ampliada, um amontoado deles nas academias, nos saraus, no movimento humanista de salvação das baleias (paradoxo?), etc., tudo isso junto funciona, efetivamente, como força ideológica  para a manutenção do capitalismo.

Sempre haverá quem aponte o exagero de quem busca a função social de tudo. Mas nós sabemos: também esse discurso tem lá sua função social.

Aliás, falar na função das coisas é tão inevitável, que estes mesmos indivíduos, contribuindo para a coisificação do homem, são os primeiros a apontar razões de ordem moral, humanista-abstrata, constitucional, etc.

A função real é a que almejamos! Desde o conhecimento técnico aplicado na extração incessante de combustível fóssil, até o emprego de vírgulas num parágrafo, tudo, enfim, deve ser repensado segundo a ótica da revolução.

Em atraso: no contexto acima descrito, a morte da poesia se explica por si só.

De fato, constatar que a boçalidade humana beira a completa hostilidade em relação ao universo da criação verbal, poderosíssima força produtiva – das mais importantes, objetivamente falando -, a mim, particularmente, tal fato assusta mil vezes mais do que a degradação da camada de ozônio. Esta, de certo modo, é conseqüência daquela.

Arriscar com os conceitos fornecidos por Marx; é preciso mais do que nunca voltar a Maiakovski, sem mistificá-lo, mas com a energia e falta de pudor com que as massas consomem diariamente a novela das oito – isso é possível? Deixemos que Maiakovski responda.

A limpidez do pensamento é o escudo. Por mais profunda a obscuridade, jamais será insuficiente a clareza como recurso primordial de expressão. Adorno que nos perdoe, é respeitável toda forma de respeito consciencioso pelas contradições, mas só acordo com a simplicidade acessível dos escritos de Trotsky.

Foi o grito eterno dos trabalhadores russos em guerra contra o inimigo de classe que forneceu o sentido cortante de suas análises; do mesmo modo que, segundo esse mesmo Trotsky, é na velocidade das guilhotinas da grande Revolução Francesa que encontramos  a origem da arte de narrar, veloz e sempre interminável, dos romancistas franceses de XIX. “Continuarei com a pena o que Napoleão começou com a espada” (Balzac).

Clareza, por fim, que não é renuncia da experimentação. Somente esta última compreendida como meio de reaver as formas da sensibilidade humana das mãos de poucos, renovando-as para o alcance de todos. Fora disso a noção de experimentação é absolutamente incompreensível. 




João .






"Ópera dos Vivos" no Arena


segunda-feira, 14 de maio de 2012

Silêncio

Por Donizete Galvão


Da pedra ser.
Da pedra ter
o duro desejo de durar.
Passem as legiões
com seus ossos expostos.
Chorem os velhos
com casacos de naftalina.
A nave branca chega ao porto
e tinge de vinho o azul do mar.
O maciço de rocha,
de costas para a cidade
sete vezes destruída,
celebra o silêncio.
A pedra cala
o que nela dói.

A Social Democracia - "O 18 Brumário", Karl Marx

(...) Contra a burguesia coligada fora formada uma coalização de pequenos burgueses e operários, o chamado partido social-democrata . A pequena burguesia percebeu que tinha sido mal recompensada depois das jornadas de junho de 1848, que seus interesses materiais corriam perigo e que as garantias democráticas que deviam assegurar a efetivação desses interesses estavam sendo ameaçados pela contra-revolução. Em vista disto aliaram-se aos operários. Por outro lado, sua representação parlamentar, a Montanha, posta à margem durante a ditadura dos republicanos burgueses, reconquistara na segunda metade do período da Assembléia Constituinte sua popularidade perdida com a luta contra Bonaparte e os ministros monarquistas. Concluíra uma aliança com os dirigentes socialistas. Em fevereiro de 1849 a reconciliação foi comemorada com banquetes. Foi elaborado um programa comum, organizados comitês eleitorais comuns e lançados candidatos comuns. Quebrou-se o aspecto revolucionário das reivindicações sociais do proletariado e deu-se a elas uma feição democrática, despiu-se a forma puramente política das reivindicações democráticas da pequena burguesia e ressaltou-se seu aspecto socialista. Assim surgiu a social-democracia. A Nova Montanha, resultou dessa combinação, continha, além de alguns figurantes tirados da classe operária e de alguns socialistas sectários, os mesmos elementos da velha Montanha, mas, mais fortes numericamente. Em verdade, ela se tinha modificado no curso do desenvolvimento, com a classe que representava. O caráter peculiar da social-democracia resume-se no fato de exigir instituições democrático-republicanas como meio – não de acabar com os dois extremos, capital e trabalho assalariado – mas, de enfraquecer seu antagonismo e transforma-lo em harmonia. Por mais diferentes que sejam as medidas propostas para alcançar esse objetivo, por mais que sejam enfeitadas com concepções mais ou menos revolucionárias, o conteúdo permanece o mesmo. Esse conteúdo é a transformação da sociedade por um processo democrático, porem uma transformação dentro dos limites da pequena burguesia. Só que não se deve formar a concepção estreita de que a pequena burguesia, por princípio, visa a impor um interesse de classe egoísta. Ela acredita, pelo contrário, que as condições especiais para sua emancipação são as condições gerais sem as quais a sociedade moderna não pode ser salva nem evitada a luta de classes. Não se deve imaginar, tampouco, que os representantes democráticos sejam na realidade todos Shopkeepers (lojistas) ou defensores entusiastas destes últimos. Segundo sua formação e posição individual podem estar tão longe deles como o céu da terra. O que os torna representantes da pequena burguesia é o fato de que sua mentalidade não ultrapassa os limites que esta não ultrapassa na vida, de que são consequentemente impelidos, teoricamente, para os mesmos problemas e soluções para os quais o interesse material e a posição social impelem, na prática, a pequena burguesia. (...)

Extraído do livro "O 18 do Brumário" de Karl Marx

sexta-feira, 11 de maio de 2012

A Tragédia de João e Maria - Cia Antropofágica de teatro

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Livremente inspirado no conto dos irmãos Grimm, a peça é uma versão adulta, e deformada de Hansel und Gretel. A História retrata a trajetória de duas crianças abandonadas pelos pais que, no desespero da fome e da impossibilidade de alimentá-los, preferem deixa-los em uma floresta.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Filmagem de "O Auto do Circo" da Cia Estável de Teatro

Na semana retrasada filmamos os espetáculo "O Auto do Circo" da Cia Estável de teatro, tratava-se da última temporada do espetáculo que teve sua última apresentação no domingo passado.

Além do enorme respeito que temos pelo cia, e amor por este espetáculo que é seguramente um dos mais fundamentais, importantes - politico-estéticamente - e lindos que já vi, ainda existe uma barreira estética quando trabalhamos uma linguagem que o produto final é diferente ao cinema. 

Isto se dá porque na medida em que um espetáculo de teatro é filmado, já não é mais um espetáculo, mas também pelo conservadorismo que o cinema burguês - e, claro, algumas produções da própria "esquerda" -  nos impõe, e de uma maneira ou de outra aceitamos, uma movimentação de nossa inventividade num perímetro muito curto, sobretudo, nas possibilidades de narração através da direção de fotografia, da montagem, da direção, direção de arte, som...

Mas de alguma forma, vemos um salto qualitativo evidente no diálogo proposto pelo espetáculo, com a nossa forma de apreensão/narração dele - o que só será explicável quando terminarmos de montá-lo. Mas de alguma forma, e como já havia acontecido em trabalhos como o com a Cia Antropofágica, vemos novas possibilidades de trabalho, principalmente no que diz respeito às formas de narrar, e ainda mais, possibilidades mais concretas de se trabalhar o épico de Brecht no cinema para além da narracão épica natural cinematográfica através da montagem.

A fotos são de Rafael Bacciotti