O autor da ação (confira vídeo acima) é um artista paulistano. Ele topou dar uma entrevista, por e-mail, ao blog. Antes, fez algumas ressalvas, que reproduzo a seguir:
“sobre o meu nome pensei bem e não gostaria que aparecesse mesmo.
não por omissão, mas pela coerência da proposta.
gostaria de assinar com um endereço eletrônico:
www.exorcity.pravida.org
o que acha?
de qualquer maneira gostaria de colocar o link junto do texto.
sei que será praticamente impossível
isso sair na íntegra no impresso
mas fico na expectativa que ao menos no eletrônico
não haja cortes.
tomei algumas liberdade de escrita
por exemplo:
escrever pixação com x (de pixel)
e não com ch (de piche)
utilizei a palavra pixo também muitas vezes”
Isto posto, publico a nota na coluna impressa da edição de hoje da seção ‘Paulistices’. E, a seguir, a íntegra da entrevista:
Por que “Pasolini Passou Aqui”?
Perigoso explicar. A expressão “Pasolini passou aqui” se auto-explica e, precisamente, naquele espaço, estimula múltiplas interpretações. O que posso afirmar, percebendo a recepção das pessoas, é que ao menos duas questões primordiais são levantadas: a primeira (definição da denúncia), como assim acabou o cinema e ninguém faz nada? a segunda, não menos importante: quem que é esse Pasolini? Um grupo de pixo? Fato é que o cine belas artes encontra-se agora desfigurado como desfigurado fora o rosto de Pasolini naquele novembro horrendo de 1975 (quando o poeta do cinema, de porte e postura, foi atropelado de maneira perversa, sob a pecha de comunista emporcalhado). “Pasolini passou aqui”, é obvio, porque os filmes dele foram ali exibidos, “Pasolini passou aqui” porque esse é o espírito da pixação: o do “fulano passou por aqui”, “Pasolini passou aqui” porque o espírito Pasolini passou por mim: psixografei-o. Atropelo cinema X atropelo Pasolini. Para alertar os desmemoriados.
Como surgiu a ideia de escrever essa frase na fachada do Belas Artes?
Muros são como túmulos: merecem epitáfios; e morremos todos os dias entre os muros. Penso que jamais devem haver retrocessos nesses aspectos: nunca um muro a mais, sempre um muro a menos: nunca um cinema a menos. A ideia de uma intervenção bem diagramada e clara, utilizando a marquise como grid para simular um letreiro de cinema (letras brancas em caixa alta), me pareceu uma boa solução para comunicar e resignificar o problema. Fiz a poetixação (como Augusto de Campos me sugeriu chamar essas perquirições) para explodir o diálogo, trazendo a questão do cinema pro universo da pixação ao mesmo tempo q a questão do pixo pro universo do cinema. Afinal, já é tempo de abrir os códigos desta linguagem marginalizada para expandir seu alcance e atuação e como diria o próprio Augusto: “filmletras quem os tivera?”.
Como foi a “operação”? Você tomou algum tipo de cuidado para não ser surpreendido?
A operação foi precisa. Utilizei a técnica que a pixação me deu. Nenhuma outra modalidade de composição me daria essa habilidade, e eu não estava sozinho. Aspirei ao letreiro luminoso que é recorrente no filme O Bandido da Luz Vermelha, de Rogério Sganzerla, mas foi mesmo o letreiro furioso do pixador #DI#, pioneiro que dominava plenamente a arte de pixar de ponta cabeça, que me inspirou na hora.
Qual sua ligação com o Belas Artes?
Não tenho nenhuma ligação com as “belas artes”, esse termo está totalmente ultrapassado. Não compactuo com beleletristes. Mas, apesar do nome, é certo q era um bom cinema, caso em extinção de boa programação (que incluía filmes representativos da história cinematográfica) e ótima localização (contrário da cinemateca por exemplo). Hoje, ficamos reféns dos filmes em cartaz da programação meramente comercial dos outros cinemas da região, da qual 1% dos filmes trazem alguma novidade, os outros 99% são carne de vaca.
Como você recebeu a notícia de que, definitivamente, o cinema não será tombado?
As coisas estão tão sem sentido que eu recebi mensagens comemorando o fato da pixação ter aparecido no jornal ao invés de lamentando a decisão da “justiça”. Cultivei, nestas ultimas semanas, a falsa expectativa de que o cinema pudesse voltar a funcionar. Mas não, o que se vê é uma política pública que privilegia os interesses do mercado imobiliário, e essa política repercuti em sérios equívocos sociais. Como abordar essa coisa delicada a qual chamamos vida? E se o cinema é, em certo grau, a extensão da nossa mente, de nossos sonhos, é justamente a nossa cabeça que está sendo atropelada. E se não tem cinema, e se o mercado rodoviarista também comete suas presepadas, e se aquela velha lei da física prova que os muros estão em movimento em relação ao corpo que está parado dentro do carro, os pixadores (melhor se forem poetixadores) vão se encarregando de distribuir palavras e imagens em movimento por aí. o cinema é o mundo?
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